Posted by : Thiago V. M. Guimarães quarta-feira, 24 de julho de 2013

Você leigo, que adora ler texto sobre física na internet, sempre se depara com a relação entre matéria e energia, e recebe definições diferentes sobre como elas se relacionam. Por esse motivo resolvi escrever esse texto, que será enorme e por isso vou dividir em 3 posts abordando 2 tópicos em cada texto. A idéia é tentar dar uma definição mais precisa sobre a relação entre matéria e energia para que você pare de receber conceitos errados e possa ter um conceito mais formal para carregá-lo para a vida.
Eu vou me basear aqui no excelente post do Professor Matt Strassler que vou deixar nas referências.

Os tópicos que irei abordar são:

1 – Matéria e Energia realmente são a mesma coisa?
2 – Aniquilação de partículas não é matéria se transformando em energia.


Mãos a obra:

1 – Matéria e Energia realmente são a mesma coisa?

Uma causa dos grandes problemas com a definição da relação entre matéria e energia é que com o tempo de estudo na física você vai aprendendo a separá-las em sua cabeça e elas se tornam (e são) coisas realmente diferentes, tanto experimentalmente quanto matematicamente. Por esse motivo não perdemos muito nosso tempo tentando explicar as diferenças e similaridades em livros e textos, aí causamos isso, um monte de gente que não sabe distinguir as duas coisas, já que os textos de divulgação fazem questão de usar definições ambíguas e que mudam de texto para texto.

O mais comum de se ler por aí é que matéria e energia são a mesma coisa e isso não é verdade – É José, o documentário mentiu pra você. Matéria e energia nem sequer estão na mesma categoria, mas vamos definir as coisas com mais calma.

Primeiramente definiremos o que é matéria e fazer isso é bem complicado. Vamos começar com uma definição simples que você não terá problemas em compreender:

- A forma mais automática de se pensar em matéria é ela como sendo as coisas a nossa volta, como cadeiras, mesas, a água, o ar, a terra. Podemos estender essa definição para os átomos, e por sua vez estender ainda mais para partículas ainda menores como elétrons, múons, taus, três tipos de neutrinos, seis tipos de quarks, ou seja, todos os tipos de partículas que não são bósons – que não são mediadoras de força.



Mas quero deixar bem claro que até mesmo essa definição acima é um tanto contraditória quando consideramos a matéria escura, por exemplo, mas isso é assunto para um tópico mais adiante.

Embora a energia seja algo bem definido fisicamente e matematicamente, no dicionário ela possui mais significados que a palavra “matéria”, ou seja, temos um problema lingüístico para distinguir precisamente o que é a energia, mas vamos tentar.

Parte do que torna complicado para descrever a energia é que ela pode tomar várias formas, das quais nem todas são conceitualmente simples. Aqui estão as quatro mais comumente encontradas:

  1. O físico R.P. Feynman possuía uma forma interessante de se definir energia, mais ainda sem ser menos abstrata. Ele dizia que energia é uma quantidade que sempre se conserva, não importa o que você faça com um corpo ou um sistema de corpos, sempre conservará essa quantidade. Mesmo em sistemas com dissipação de energia podemos encontrar a quantidade perdida pelo corpo em forma de calor, som, vibração, etc.
  2. A energia pode ser “confinada” na massa de um objeto, que é o famoso E = mc², e também chamado de "energia de repouso", uma vez que é a energia que um objeto tem quando está parado.
  3. A energia está associada com o movimento de um objeto, cujo nome técnico é "energia cinética". Este tipo de energia é bastante intuitiva e nos leva a notar que os objetos mais rápidos têm mais energia do que os mais lentos e juntando com a primeira definição, um objeto de maior massa tem mais energia cinética do que um mais leve, se os dois estiverem viajando na mesma velocidade.
  4. A energia pode ser armazenada nas relações entre os objetos (energia potencial). Ele pode ser armazenado em uma mola esticada, ou na água atrás de uma represa, ou na interação gravitacional da Terra com o Sol, ou na relação entre átomos numa molécula, ou quando simplesmente levantamos uma pedra com nossas mãos. É aquele conceito simples de energia potencial que aprendemos no ensino médio.

As quatro definições acima estão longe de serem simples de se entender assim de primeira, então vá discutir com seus amigos e ler mais textos.

Mas vamos resumir tudo isso de forma BEM simplória dizendo que energia não é por si só um objeto. Por exemplo, Um átomo contém energia, mas ele não é energia propriamente. E você precisa saber que partículas se movendo por conta própria através do espaço podem ter dois tipos de energia: energia relacionada à massa e energia relacionada ao movimento.

2 – Aniquilação de partículas não é matéria se transformando em energia.

(Não é a minha intenção explicar aqui o processo de aniquilação entre partículas e suas antipartículas, mas sim analisar seus produtos. Talvez no futuro eu possa escrever ou traduzir algo sobre isso)

Talvez aqueles que estejam a pouco tempo pesquisando e lendo materiais de divulgação sobre física não tenham tido contato com o assunto. Então vou explicar com mais calma.

Quando uma partícula e sua antipartícula se encontram elas se aniquilam e, segundo muitos textos e alguns documentários por aí, o resultado dessa colisão é nada mais que simples e “pura” energia. Mas infelizmente, a afirmação não é verdadeira.


Na maior parte dos textos que falam sobre isso, a “energia pura” é referida aos fótons provindos da aniquilação entre elétrons e pósitrons. Mas o fóton também não é energia, ele contém energia! Por exemplo, minha casa possui a cor branca, mas ela não é a cor branca, ou seja, a cor branca é apenas uma propriedade da minha casa.

É totalmente corriqueiro encontrar por aí leigos que acreditam que fótons são de fato “energia pura”, mas na verdade eles são partículas, como qualquer outra provinda de oscilações em um campo correspondente¹, da mesma forma que um elétron², por exemplo. Quando um elétron e um anti-elétron (pósitron) se aniquilam, a energia dos fótons produzidos é igual à massa do par elétron-pósitron, já que a energia é conservada.



Mas podemos considerar o aniquilamento entre outras partículas, por exemplo. Quando um múon se aniquila com o antimúon, existe a mesma probabilidade de resultar em um par de fótons ou em um par elétron-pósitron. Ou seja, temos matéria se aniquilando em matéria e não em energia pura. O aniquilamento do par múon/antimuon em dois fótons ou no par elétron/pósitron representa exatamente o mesmo processo, então não precisamos fazer distinções que não existem!

Com isso acredito que tenha ficado claro que não é verdade que matéria e a antimatéria se aniquilam formando energia propriamente dita, elas se aniquilam formando outras partículas que contém energia. Ok?!


---

Espero que tenham gostado da nossa primeira parte. À medida que eu for encontrando tempo vou escrevendo mais. Lembrando que estou me baseando nos textos do professor Matt Stressler, então dê uma checada no blog dele que vocês irão achar bastante coisa legal.


1- A Teoria Quântica Campos, que é o framework de onde saíram algumas das teorias mais bem sucedidas que temos atualmente, trata as partículas como sendo oscilações em diferentes campos. Um elétron é uma oscilação em um campo fermiônico com determinadas propriedades. Já o fóton é um oscilação em um determinado campos vetorial, no caso, o campo elétrico.

2- Acho importante fazer aqui um adendo. Note que falamos que fótons são partículas assim como elétrons, mas no início definimos que elétron é matéria propriamente dita e fótons (que é um bóson) não. O que acontece é que a definição de "partícula" é mais abrangente do que a definição de matéria. Em "partículas elementares" temos duas classes que são os Férmions e os Bóson, os férmions são matéria propriamente dita, da maneira que de definimos. Por sua vez, bóson são partículas mediadoras de força e estão fora da nossa definição de matéria.


*E uma dica final dessa seção: É corriqueiro até mesmo professores passarem uma visão de que a energia é quase um substância fluída que passa de um corpo para outro, mas isso não é verdade, energia não é uma substância e nem é trocada de forma continua entre dois corpos, mas deixemos isso para um próximo texto 

{ 28 comentários ... Abandone toda a esperança aquele que aqui entrar }

  1. Olá ! Você comenta: "Embora a energia seja algo bem definido fisicamente e matematicamente....." e no entanto não encontrei nenhuma definição da mesma no seu texto. Apenas:

    ...energia é uma quantidade que sempre se conserva......
    A energia pode ser “confinada”......
    A energia está associada.....
    A energia pode ser armazenada ..........

    Qual seria o conceito de energia bem definido ao qual vc se refere ?

    Obrigado e parabéns pela sua página.

    Nelson

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    1. Olá Nelson, boa noite e obrigado pelo comentário. Note que eu digo que a energia é bem definida fisicamente e matematicamente, mas infelizmente a linguística fica nos devendo. Então por exemplo, eu experimentalmente consigo medir a energia de uma partícula e consigo demonstrá-la matematicamente (ouseja, definí-la bem do ponto de vista da física e da matemática). Como a línguistica falha ao nos ajudar a definir com palavras o que é energia eu defini ela como "uma quantidade (de alguma coisa) que sempre se conserva", o que não deixa de ser bem abstrato. Mas indico a leitura do Livro Física em 12 lições, em que o autor faz uma excelente abordagem do assunto usando essa mesma definição.

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    2. Concordo. O problema é mesmo querer que a linguística permita definir algo tão complexo.

      Abraços

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  2. Escreveu, escreveu escreveu, criticou textos e definições sobre energia e matéria e no final das contas não explicou nada! Pra fazer mais do mesmo e não chegar a lugar nenhum, não precisa criticar nada. Se as definições de massa e energia fossem tão simples, não exigiriam um rigoroso estudo e compreensão fenomenológica à luz de várias visões epistemológicas e ontológicas da Física. Se não é para formar Físicos, não precisa tentar impressionar os "leigos". De que são feitas as partículas tão citadas no seu texto?

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    1. ow, calma lá amigão. Primeiramente não estou definindo massa e energia! E disse desde o começo que a definição de matéria e energia era de fato algo complicado. Segundo desde quando só posso escrever "para formar físicos" ?

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    2. Só para complementar, gostaria de dizer que essas definições que "falam, falam e não dizem nada" saíram do Feynman e Matt Stressler, como citei no texto. Mas deixo aí um convite, um pedido e um desafio; Por favor faça um texto melhor, um que defina precisamente esses termos, que diga alguma coisa. E detalhe, não faça isso para um graduando em física, pois eles não são os únicos com direito a informação, a aprender ciência!

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    3. Adoro pessoas que tem essa necessidade de masturbação mental como você Jeff Marinho, cada linha que escreve é para se sentir maior e melhor que outros. Sua crítica também é tão simplória e de tão baixa qualidade que não acrescenta em nada na divulgação científica e muito menos na ciência. Fico com NOJO de pessoas elitistas que acham que o conhecimento só serve para formar uma "casta", como se não fosse necessidade da nossa sociedade a divulgação científica. Como se o analfabetismo científico não fosse um problema. Você deveria se envergonhar dessa insignificância mental e limitação ao achar que o conhecimento deve ser limitado para formar físicos e não para instruir toda uma população, são pessoas como você que jogam no lixo a educação brasileira. Pessoas como você que se formam e são péssimos professores que não sabem ensinar e nem qual é a necessidade de trabalhos feitos como desse blog. Parabéns por ser tão limitado.

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    4. pois é, são pessoas assim que desanimam a gente de escrever algumas coisas....

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    5. Dou os parabéns ao Thiago Guimarães pelo texto. Está muito bom. A questão é: é possível formar físicos com um texto? O texto foi perfeitamente informacional. Eu faço textos para leigos, e compreendo a dificuldade de um trabalho. E o texto acima não é para impressionar leigos, é para físicos mesmos, não os tops de carreira, mas os que estão começando, aprendendo.

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  3. Tenho uma dúvida. Se levarmos em conta que o fóton não possui massa de repouso, diferentemente das outras partículas, e sendo também um bóson mediador de força e como você mesmo citou no início, bósons não são enquadrados como matéria. O que acontece no caso é que temos no primeiro exemplo(elétron e um anti-elétron)especificamente como produto, partículas que contém puramente energia. Então quando você diz que o produto não é puramente energia você está se referindo ao fato de ser uma partícula certo? Mas sendo essa partícula um bóson desprovido de massa...fiquei na dúvida.. Belo post, abraço!

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    1. Primeiramente a forma que definimos partícula e matéria não é a mesma. A tomar pela definição que usamos no texto o fóton é partícula, mas não matéria propriamente dita. Na aniquilação entre um elétron e um pósitron eu tenho como resultado um fóton, esse fóton por sua vez carrega energia. Compreendeu?

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  4. É bom ver que existem pessoas preocupadas em esclarecer as coisas, muitas vezes assistimos um documentário pensando que determinado assunto foi desenvolvido de forma correta, porém podemos ver que não é bem assim. Parabéns pelo texto.

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  5. 1ºQuando dizem que uma partícula não tem massa,o que isso quer dizer exatamente?
    2ºSobre o Bóson de Higgs:É a partícula que dá massa a matéria ou a existência da partícula de Higgs comprova o campo de higgs que é o que dá massa a matéria?
    Não precisa dá a resposta no meu comentário.Vc pode responder com um texto no blog.Desde que não demore.rsrsrsrsr

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    1. 1º Uma partícula sem massa quer dizer exatamente que ela não tem massa de repouso, e sua velocidade é a da luz.
      2º Eu traduzi um texto sobre isso que está disponível no site do universo racionalista: http://universoracionalista.org/por-que-o-higgs-e-importante-em-poucas-frases/

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  6. Acho que a melhor maneira de explicar isso é via partículas fundamentais bósons/férmions. A radiação seja ela eletromagnética ou resultante do decaimento dos núcleons, também não é a definição completa de energia. E quando a gente fala de "conservação" a gente precisa apontar exatamente a que estamos nos referindo, como por exemplo "conservação de momento angular", "conservação de momento magnético", "conservação de número léptônico, bariônico". A definição nunca será completa...

    A troca de energia pode ser feita por exemplo via fônons ou momento vibracional. Via movimento browninano, através de colisões ineslásticas...

    A real é que ninguém sabe exatamente o que é energia, muito menos matéria e a definição linguística de ambas, é muito vaga. Isso é um verdadeiro vespeiro.

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    1. Obrigado pela resposta. E realmente se entrarmos mais para a parte acadêmica conseguimos definir a energia de várias formas e dar uma explicação um pouco mais sólida. Mas infelizmente escrever para não físicos é como andar em um corda bamba, e como você disse, definir em palavras o que é energia de fato é um verdadeiro vespeiro.

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  7. tenho uma pergunta sobre a parte de aniquilaçao:
    no texto,voce diz:
    -"Quando um múon se aniquila com o antimúon, existe a mesma probabilidade de resultar em um par de fótons ou em um par elétron-pósitron. Ou seja, temos matéria se aniquilando em matéria e não em energia pura. "
    eu estava lendo um artigo sobre modelo padrao onde fala:
    -"Por exemplo, podemos supor que o vacuo esta cheio
    de pares virtuais de muons e antimuons que normalmente n~ao s~ao detectados. Porem, em um experimento
    de aniquilac~ao de um eletron e um positron (reais) em
    um acelerador/colisor de particulas aparecem muons
    reais que s~ao observados nos detectores de particulas.
    De onde vieram? Um par muon-antimuon virtual recebeu a energia resultante da aniquilac~ao e deixou a
    regi~ao (muito pequena) onde ocorreu a interac~ao, como
    um par de muons reais."
    >ou seja:a aniquilaçao das particulas de materia em materia,na verdade,trata-se da "transferencia" de energia de particulas reais para particulas virtuais?

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  8. Parabéns pelo blog. Os textos são concisos e bastante claros. Perco algumas horas lendo, hehe. Continue assim!

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    1. Valeu Willian, já postei a segunda parte desse texto, dá uma olhada lá!

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  9. Excelente texto Thiago. A divulgação da ciência é de extrema importância e você tem o cuidado de trazer temas que são facilmente distorcidos pelos auto-proclamados divulgadores da ciência. Parabéns pelo seu trabalho!

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    1. Valeu Karen, aproveita e já dá uma lida na continuação do texto que postei hoje!

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  10. Muito bom os textos. Você deixou no ar a seguinte questão: "E uma dica final dessa seção: É corriqueiro até mesmo professores passarem uma visão de que a energia é quase um substância fluída que passa de um corpo para outro, mas isso não é verdade, energia não é uma substância e nem é trocada de forma continua entre dois corpos, mas deixemos isso para um próximo texto" Você poderia mostrar a resposta ou indicar a bibliografia. Obrigado.

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  11. Olá! Gostei muito do texto. Sou um leigo curioso e apaixonado pelo mundo da física e pelos mistérios do Universo. Eu criei um grupo para debater o assunto há uns 2 anos e foi por meio do post de um dos membros que eu encontrei esse blog. Grato pelas informações e se me permite, deixarei o link do grupo aqui. Todos os que são interessados no assunto são bem vindos!

    https://www.facebook.com/groups/241103345909291/

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  12. Olá, gostaria de saber alguns exemplos de energia
    Larissa

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    1. Desculpe Larissa, mas como assim "exemplos de energia"? Você está falando sobre energia mecânica, química... essas coisas?

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  13. Thiago, bom texto: mas não achas que a definição de energia como sendo "quantidade de alguma coisa que sempre se conserva", acaba não definindo a "coisa" energia, mesmo sendo um ser "abstrato" mas REAL?
    Uma pergunta final: se não existisse matéria, existiria energia?

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