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(Quase) Tudo que você precisa saber sobre Energia Escura: um review for dummies.
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Imagem qualquer para chamar sua atenção e fazer você clicar no texto. Fonte: https://www.aei.mpg.de/gravitation-and-cosmology |
6 lindos meses após o último post, finalmente consegui encontrar um tempo para escrever algo por aqui. Eu queria abordar uma série sobre cosmologia quântica, mas não vou prometer porque não vou cumprir, talvez nas minhas férias eu sinta vontade de escrever um pouco mais, mas por enquanto tá foda!
Pois bem, o tempo passa, o tempo voa, a poupança Bamerindus faliu⁰, mas Matéria e Energia Escura continuam numa boa... por esse motivo resolvi fazer um "manual de sobrevivência da Energia Escura" e possivelmente depois faça da Matéria Escura. Sem mais enrolação, vamos começar!
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Mike Tyson - Renomado cosmólogo, apresentador da nova série cosmos. |
Quadro de avisos:
1 - Termos não definidos estão hiperlinkados a textos explicativos.2 - Dessa vez não coloquei, no final do texto, o nome dos artigos usados, mas sim o Link direto para os artigos, fica mais fácil para vocês e pra mim.3 - Caso você não consiga visualizar as equações abaixo, instale um plugin de LaTeX ao seu navegador. A conversão do texto para imagem da equação deve acontecer automaticamente.
First things first!
Para que você não fique completamente perdido em muitas terminologias, é prudente começar com um rápido dicionário.
- Expansão do Universo: Ela acontece em todos o momentos da vida do Universo e possui diferentes velocidades, sendo guiada pelo conteúdo material do Universo (radiação, Matéria Escura, Energia Escura).
- (Grande) Inflação Cósmica: É um período logo após o Big Bang no qual o Universo se expandiu mais de 1 octilhão de vezes em um infinitésimo de segundo.
- (Grande) Inflação Cósmica: É um período logo após o Big Bang no qual o Universo se expandiu mais de 1 octilhão de vezes em um infinitésimo de segundo.
- Inflaton: partícula responsável por fazer essa inflação acontecer.
- Expansão acelerada (atual/recente): É a expansão cósmica que vemos hoje, embora ela seja acelerada, ainda é muito, mas muito menor que a inflação cósmica.
- Ajuste fino/parâmetros soltos: Teorias que possuem constantes cujo valor precisa ser escolhido de forma a descrever o Universo que vivemos, ou seja, de forma arbitrária. O que é energia escura?
Não sei! Sérião mesmo.... mas a intenção nossa aqui é descrever o que é energia escura e não falar o que ela é.
Quando eu fazia doutorado eu me vi diante de uma situação peculiar porém normal. Todo dia o lixo que eu colocava na rua amanhecia revirado. Como qualquer pessoa normal, eu achei que eram os cachorros da rua, porém o cara que dividia apartamento comigo (Salve pro Dino!) notou que o cesto de lixo da rua era bastante alto para a maior parte dos cachorros alcançarem. Com isso, levantamos a hipótese de que seriam ou moradores de rua da região, ou catadores de reciclados. Levantamos muitas evidências ao longo dos dias, o lixo parecia sempre rasgado de forma grosseira e encontramos pelo de animal em volta da lixeira. Assim, conjecturamos que deveria ser um mamífero peludo de 1,70m de altura no mínimo. A conclusão óbvia era que poderia ser um animal novo, desconhecido pela ciência (um Lobisomem talvez) que estava atacando nosso lixo praticamente todos os dias. Resolvemos chamá-lo de "Dark Animal", pois não conseguimos defini-lo. Em um fatídico dia, Dino chega em horário alternativo em casa e flagra um possível candidato à Dark Animal... era um fucking CAVALO ao lado do nosso lixo destruído. O cavalo preenche as características de Dark Animal, mas não o pegamos no flagra, ele apenas tem todas as características necessárias para ser nosso devorador de lixo. Como bons cientistas deixamos esse assunto em aberto tendo o cavalo como principal candidato à Dark Animal, entretanto não poderíamos afirmar com certeza... e se fosse um Lobisomem ou qualquer outro animal desconhecido da ciência e da "criptozoologia", eu poderia descobrir um animal que ganharia meu nome, seria muito loco!
Da mesma forma que não conseguimos descobrir com clareza quem era o Dark Animal devorador de lixo, apenas conseguimos levantar evidências das suas características e existência, nós também não conseguimos saber quem é a energia escura, apenas conseguimos levantar evidências das suas características e existência, e é disso que se tratará todo o texto.
A existência de energia escura precisa ser compreendida olhando para o início da cosmologia moderna, que se deu com Albert Einstein há quase 103 anos atrás com a publicação do seguinte artigo:
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Artigo do Einstein de 1917 - Para uma tradução em inglês clique aqui. |
Nele, Betão usou as equações da Relatividade Geral (TRG) para tentar modelar o Universo pela primeira vez. Utilizando a equação de campo da TRG que já discutimos milhares de vezes nesse blog, a relembrar:
$R_{\mu \nu} - \frac{1}{2} g_{\mu \nu} R = (8 \pi G/c^{4})T_{\mu \nu}, (1)$
na qual o lado esquerdo (sua esquerda) dessa equação descreve como a geometria do Universo se comporta frente uma quantidade de energia¹ (que está do lado direito da equação). Ou seja, uma certa densidade de energia causa uma deformação geométrica no espaço-tempo e isso é entendido como gravidade.
Fazendo uma análise não lá muito aprofundada, Einstein pensou que sua equação mostrava que tudo no Universo estava constantemente se atraindo, não existindo nenhuma forma de compensar essa atração, assim grandes conjuntos de galáxias, chamados de Cluster, deveriam colapsar² rapidamente, ao invés permanecerem estáveis, como é observado. A sacada de Einstein foi incluir a mão, na sua equação, um termo capaz de atuar de maneira contrária à gravidade, ou seja, enquanto a gravidade atuaria de forma a puxar os objetos, esse termo "empurraria" os objetos para fora, mantendo os Clusters estáveis. O remendo na equação fica assim:
$R_{\mu \nu} - \frac{1}{2} g_{\mu \nu} R +g_{\mu \nu} \Lambda = (8 \pi G/c^{4})T_{\mu \nu} . (2)$
Esse novo termo, $\Lambda$, que ganhou o nome de constante cosmológica (CC), seria responsável por exercer uma pressão negativa³ sobre a matéria. A essa altura do campeonato, não se falava em Universo expansivo, a visão da época se pautava em um Universo homogêneo, infinito e estático⁴, portanto a CC servia unicamente para evitar o colapso gravitacional de estruturas como clusters. Entretanto, um cara russo chamado Alexander Friedmann mostrou⁵ que as equações de Einstein não precisavam de nenhuma CC, elas próprias já levariam a um Universo expansivo o suficiente para evitar o colapsos das estruturas citadas.
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Artigão matador do Friedmann, que pode ser lido aqui |
De início, Einstein não se convenceu dos resultados de Friedmann, mas depois considerou a CC o maior erro de sua vida. Dramas a parte, os resultados de Friedmann, que mostravam um Universo naturalmente expansivo, fizeram com alguns físicos pensassem: "Se o Universo está se expandindo, claramente tudo esteve muito próximo no passado", e daí surgiu a ideia de "rebobinar" a expansão cósmica, dando origem assim a Teoria do Big Bang (TBB). Caso você queira entender o que é a expansão do Universo em si, dê uma olhada nesses textos anteriores: texto legal e texto mais legal ainda.
Com a TBB criada, começou-se a formular uma teoria cosmológica padrão. Avanços teóricos e observacionais mostraram que após o BB o Universo deveria ser opaco e dominado por radiação nos primeiros 380 mil anos. Depois ele se tornaria transparente e seria dominado por matéria bariônica. Nessa visão não tínhamos ainda encontrado a necessidade da existência da Energia Escura... ou seja, o "saco de lixo" da cosmologia ainda não tinha sido revirado por nenhum "Dark Animal".
Um dos principais resultados que sustentavam a teoria do Big Bang, além da previsão e medição da radiação cósmica de fundo, foram os dados obtidos por Hubble, que mostravam que quanto mais distantes as galáxias estavam, mais rápidas elas se afastavam. Cabe um adendo aqui, conhecendo uma equação para a velocidade de afastamento das galáxias era possível saber em qual momento elas estariam "todas juntas", ou seja, seria possível calcular a idade do Universo. Os dados iniciais de Hubble levaram a uma idade cósmica menor que a idade geológica da Terra, porém, com medições posteriores mais precisas chegou-se ao valor de 14,6 bilhões de anos, como é aceito hoje.
A medida que a medição do afastamento de galáxias ficou mais precisa, notou-se que as equações de Friedmann levavam a um Universo expansivo, mas nem tanto como observado. O que o resultado dessas observações querem dizer é o seguinte: As equações que Friedmann, a partir das equações de Einstein, modelavam um Universo expansivo, porém as observações do afastamento de galáxias mostravam que a velocidade de expansão deveria estar aumentando.... isso significa que alguma coisa estava "esticando" o Universo, ou seja, aplicando uma pressão negativa que causasse uma expansão acelerada. Opa, agora algo mexeu no "saco de lixo" da cosmologia.
Para explicar essa expansão acelerada, os físicos pensaram na CC assim como pensamos em culpar o cavalo, ele já estava do lado do lixo, seria o candidato mais provável. Porém, da mesma maneira que não descartamos a hipótese de ser outro bicho revirando nosso lixo, os cientistas também não descartaram a hipótese de ser outra coisa que estivesse acelerando a expansão do Universo. Da mesma forma que nomeamos o bicho desconhecido de "Dark Animal", os cientistas nomearam essas "outras coisas" de "Dark Energy" (Energia Escura em tradução literal).
Um ponto importante que devemos citar é que entender a Matéria e Energia Escura é fundamental para entender o Universo, pois estimativas atuais mostram que a maior parte da matéria existente deve ser Matéria Escura e que a Energia Escura representa mais de 73% de todo conteúdo do Universo. Além disso, estamos passando atualmente por uma fase de transição do Universo, na qual a Energia Escura começa a dominar a Matéria escura e, com isso, ditar a dinâmica de expansão cósmica.
Agora que ouvimos a história da existência de um dos "Dark Animals" da cosmologia, vamos discutir sobre os possíveis candidatos à vaga de "revirador de saco de lixo cosmológico".
Candidatos
Constante Cosmológica
Uma das formas mais simples de tentar descrever uma expansão acelerada é justamente incluindo um termo de "Constante Cosmológica" na equação de Einstein. A fim de modelar isso de forma mais simples, podemos considerar que $\Lambda$ se comporta como um fluído ideal, o que leva diretamente a seguinte pressão negativa
$p_{\Lambda}=-\frac{\Lambda}{8\pi G}, (3)$
aqui, $G$ é a constante gravitacional. Por sua vez a densidade de energia é dada por
$\rho_{\Lambda}=\frac{\Lambda}{8\pi G}=-p. (4)$
Isso significa que a medida que o Universo se expande é realizado trabalho sobre o fluído $\Lambda$, permitindo que a densidade de energia permaneça constante⁶ a medida que o volume do Universo aumenta.
A TRG não impõe muitos limites sobre a forma de $\Lambda$, assim como apenas a maneira de se rasgar um saco de lixo não impunha limites sobre a forma do nosso Dark Animal. Porém a mecânica quântica nos ajuda a levantar mais informações sobre quem é a CC. Quando fazemos as contas para entender o comportamento da energia do vácuo quântico⁷ para um campo escalar com potencial qualquer, vemos que as equações para densidade de energia e pressão são muito semelhantes à eq. (4) acima. Além disso, a TRG nos diz que o tem energia gravita⁸, logo a energia de ponto zero (vácuo quântico) também deforma o espaço-tempo. Isso tudo nos faz imaginar que a constante cosmológica pode ter sua origem como um tipo de energia de ponto zero, a qual existe mesmo que nenhuma partícula esteja presente.
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Dois exemplos de potenciais $V(\phi)$, no primeiro o vácuo do potencial é a região mais baixa, que encosta no eixo $\phi_{1}$. No segundo potencial existem duas regiões de vácuo verdadeiro, que são as "corcovas" mais baixas, e uma região de falso vácuo, que é aquele morrinho central que encosta no eixo $\phi_{1}$. Caso você queira uma discussão mais detalhada veja aqui. Fonte da imagem. |
Essa definição, embora interessante, é ainda muito vaga, pois qualquer coisa que contribua para a energia do vácuo agirá como constante cosmológica, isso permite inclusive uma outra abordagem da CC que é muito interessante, a qual considera que ela nem sempre pode ter sido realmente uma constante, uma vez que podemos criar uma constante cosmológica efetiva do tipo:
$\Lambda_{eff} = \Lambda_{0} + V(\phi).$
Essa igualdade nos diz o seguinte: a expansão do Universo é guiada por uma CC cujo valor realmente nunca muda, dada por $\Lambda_{0}$, porém pode existir um (ou mais) potencial, associados a campos escalares⁹, que interferem na expansão acelerada do Universo e podem mudar com o passar do tempo, no caso estamos falando de $V(\phi)$.
Embora a visão da CC como energia de ponto zero seja uma explicação razoável, devemos observar alguns pontos:
1 - Essa energia de ponto zero realmente existe?
Sim, e isso é muito bem mostrado pelo efeito Casimir e pelo desvio de Lamb (clique sobre os hiperlinks para saber mais).
Sim, e isso é muito bem mostrado pelo efeito Casimir e pelo desvio de Lamb (clique sobre os hiperlinks para saber mais).
2 - O Problema da Constante Cosmológica.
Não importando se estamos falando de uma CC ou uma CC efetiva, o que temos que nos questionar é sobre qual o valor atual que os dados observacionais encontraram para ela. No caso, hoje mensuramos que para o Modelo Cosmológico Padrão (conhecido como $\Lambda CDM$, leia mais aqui) descrever o Universo em que vivemos, a densidade de energia da CC deve ser
$\rho_{\Lambda}\leq 10^{-48} GeV^{4}.$
Se você não está acostumado as escalas físicas, saiba que o valor esperado para a constante cosmológica expandir nosso Universo aceleradamente é algo realmente pequeno.
Como evocamos um princípio da mecânica quântica para tentar explicar a CC, é importante ver o que nossas teorias da Física de Partículas e Campos têm a dizer sobre os valores de vácuo que elas conseguem calcular. Nossas teorias mais aceitas dizem que, no início do Universo, as 4 forças fundamentais (Força forte, fraca, gravitacional e eletromagnética) se comportavam como uma única força e, a medida que o Universo foi resfriando, elas foram se separando. A força da gravidade é a primeira a se separar das demais forças, depois disso a força forte se separa, porém para descrever o momento da separação da força forte nossa teoria vigente (Cromodinâmica Quântica - QCD) prevê a existência de uma energia de vácuo dada por
$\rho^{CQD}_{\Lambda}\sim 8,1 \times 10^{-3}GeV^{4}.$
Após o desacoplamento da força forte, restou ainda a força eletrofraca, que era a unificação da força fraca e com a eletromagnética, hoje descrita pela Teoria de Weinberg-Salam. Para que o desacoplamento dessas duas últimas forças aconteça, nossa teoria prevê que o vácuo quântico deveria ter o valor de
$\rho^{E.F}_{\Lambda}\sim 1,6\times 10^{9}GeV^{4}.$
Comparando os valores que a Física de Partícula prevê para o vácuo quântico cosmológico e o que é observado, nota-se claramente que esses valores são absolutamente discrepantes. Mano, você precisa de só $10^{-47} GeV^{4}$, enquanto que na melhor das hipóteses temos $8,1 \times 10^{-3} GeV^{4}$. Essa absurda diferença de valores é chamada de "Problema da Constante Cosmológica" por motivos óbvios.
Essa explicação acima não é a única forma de abordar o que é o Problema da CC, existem diversas formas de se o fazer. Alguns físicos dirão que o problema é a grande diferença entre o valor observado e o valor teorizado para a energia de ponto zero. Outros dirão que o problema é na verdade explicar porque $\Lambda$ não é zero, ou mesmo porque a densidade de energia de ponto zero é da mesma ordem de grandeza da densidade de energia do Universo. Há ainda aqueles que dizem que o problema central surge da sistemática necessidade de ajuste fino que a teoria precisa por conta da instabilidade radiativa, que surge da teoria de perturbação.
O ponto central aqui, que é a forma como EU gosto de olhar para esse para esse problema, é: "O que é a energia de ponto zero e como ela gravita?".
Campo escalar
Para não enrolar muito, a definição de campo escalar e vetorial pode ser vista nesse outro texto do blog.
Nós conhecemos apenas um único campo escalar fundamental, que é o campo de Higgs, mas no nosso mundo colorido nutrimos a ideia de que devem existir muitos outros escalares desconhecidos.
A cosmologia quântica tem um carinho especial por esses campos, pois existe um bom motivo para considerarmos sua existência e relevância cosmológica. Como citamos, o modelo de Weinberg-Salam descreve como a força fraca se separa da força eletromagnética no início do Universo e, para isso, é necessária a existência de um campo escalar, chamado campo de Higgs, não entrarei em maiores detalhes sobre isso, pois você pode ler aqui. Se o campo escalar de Higgs é necessário no início do Universo, talvez ele cumpra demais papeis na cosmológica, como por exemplo causar a grande inflação inicial do cosmos, ser a Matéria Escura e quem saber ser até a Energia Escura.
Muita discussão foi feita sobre o campo de Higgs, hoje ele é um bom candidato ainda a ter realizado a inflação cósmica, porém ele não possui características técnicas adequadas para Matéria e Energia Escura. Entretanto, podemos pensar: Será que existe um outro campo escalar, desconhecido até o momento, que seja capaz de atuar como matéria escura e energia escura? É nesse espírito que surge a cosmologia do campo escalar, que consiste em tentar descrever toda a história do Universo a partir de um ou mais campos escalares que possam, talvez, existir.
Existem trabalhos muito interessantes mostrando como um campo escalar pode atuar como Matéria Escura, mas nosso foco aqui é na sua atuação como Energia Escura. Teorias que consideram que a Energia Escura seja um campo escalar são chamadas de modelos de Quintessência¹⁰.
Se você leu meus textos sobre Inflação cósmica você terá uma facilidade enorme em entender o mecanismo por trás dos modelos de Quintessência, pois é praticamente a mesma coisa. Como eu expliquei nos textos linkados acima, nos instantes iniciais, nosso Universo passou por uma expansão muito abrupta e que durou um infinitésimo de segundo. A melhor teoria para explica essa expansão absurda é que de um campo escalar chamado inflaton rolou lentamente para o vácuo de um potencial cosmológico, liberando energia suficiente para que o cosmos se expandisse de maneira absurdamente rápida. Após essa expansão, o Universo deve continuar se expandindo de forma acelerada, porém de maneira bem mais suave.
Com essa ideia em mente, sabendo que um campo escalar pode atuar como o gatilho de uma expansão absurda, é fácil pensar que da mesma forma um campo escalar pode estar acelerando o Universo agora, quem sabe pode ser até mesmo o que sobrou do inflaton.
Seguindo a mesma ideia da teoria da grande inflação inicial, podemos pensar que a expansão acelerada atual se dá a medida que um campo escalar cosmológico desce potencial a baixo em direção ao seu vácuo. Para a teoria funcionar, basta forçarmos que a escala de energia do vácuo do potencial seja
$\rho^{\phi}_{\Lambda} \approx 10^{-47}GeV^{4},$
já que esse valor é observado hoje. Note que já conhecemos esse valor e então forçamos o vácuo quântico do nosso modelo de Quintessência a respeitá-lo, não é algo que surge naturalmente batendo lindamente com o resultado observacional. Embora isso evite o problema do valor da energia de ponto zero, como ocorre com a CC, nós nos deparamos com outros problemas, como "quem car***os é esse campo escalar?" Eu sei lá quem seria.... o Higgs não tem como ser, então tem que ser algo novo, algo que nunca vimos antes, tipo o lobisomem que poderia estar rasgando meu lixo. Além disso, que potencial seria esse que o campo respeitaria e que levaria exatamente a expansão acelerada que vemos hoje? Existem milhares de potenciais a serem testados e, quando os testamos, muitas vezes precisamos ajustar alguns parâmetros para que batam com o observado, o que compromete a falseabilidade da teoria.
Campos vetorial
Definição rápida: Campos vetoriais fundamentais, em física de partículas, são campos associados aos bósons de spin 1, como o fóton por exemplo (bósns Z e W também) ou seja, o campo eletromagnético é um campo vetorial cujo mediador de força (bóson) é o fóton.
Pouca gente sabe, até mesmo quem faz física, que campos vetoriais podem ser usados para fazer cosmologia. Embora eles quebrem a simetria de Lorentz, termo bonito para "escolhem um direção preferencial para se propagar e com isso fodem o conceito de isotropia do Universo", é possível criar modelos cosmológicos usando esses caras.
Como campos físicos usados em cosmologia precisam ser de longo alcance, um cara que dá pra usar aqui é o próprio campo eletromagnético, mas existem muitas pesquisas com campos vetoriais genéricos, portanto vamos discutir no âmbito geral.
As pesquisas atuais têm mostrado que os campos vetoriais podem sim ser bons candidatos a inflaton e Energia Escura em certos aspectos. Primeiro que é possível reduzir sua falta de isotropia até um ponto coerente com o observado. Segundo que esses campos parecem poder atuar mesmo sem ter interação com a matéria bariônica. Nesse âmbito, o problema dos parâmetros livres que precisam de ajuste fino, que surgem nas demais teorias, também aparece aqui em mesma quantidade. Um último ponto é que a determinação da massa desses campos é muito dependente dos parâmetros escolhidos para o potencial, por exemplo, um potencial que guie corretamente a inflação levaria a massa do campo como sendo da ordem de $TeV$, enquanto que para modelar a Energia Escura seria necessário um campo com massa da ordem de $10^{-33} eV$.
Modelos cosmológicos cuja dinâmica é guiada por campos vetoriais recebem ainda pouca atenção em física, apesar dos esforços de alguns cientistas, isso se deve a alguns problemas sérios sobre a natureza vetorial desses campos que interfere diretamente na isotropia do Universo. Nos modelos citados acima é necessário que se trabalhe com campos vetoriais que levem a uma anistropia reduzida, respeitem a causalidade e conduzam corretamente a dinâmica do Universo. Um outro ponto negativo é que esses modelos levam à equações dinâmicas bem mais complicadas do que as demais teorias.
As pesquisas atuais têm mostrado que os campos vetoriais podem sim ser bons candidatos a inflaton e Energia Escura em certos aspectos. Primeiro que é possível reduzir sua falta de isotropia até um ponto coerente com o observado. Segundo que esses campos parecem poder atuar mesmo sem ter interação com a matéria bariônica. Nesse âmbito, o problema dos parâmetros livres que precisam de ajuste fino, que surgem nas demais teorias, também aparece aqui em mesma quantidade. Um último ponto é que a determinação da massa desses campos é muito dependente dos parâmetros escolhidos para o potencial, por exemplo, um potencial que guie corretamente a inflação levaria a massa do campo como sendo da ordem de $TeV$, enquanto que para modelar a Energia Escura seria necessário um campo com massa da ordem de $10^{-33} eV$.
Modelos cosmológicos cuja dinâmica é guiada por campos vetoriais recebem ainda pouca atenção em física, apesar dos esforços de alguns cientistas, isso se deve a alguns problemas sérios sobre a natureza vetorial desses campos que interfere diretamente na isotropia do Universo. Nos modelos citados acima é necessário que se trabalhe com campos vetoriais que levem a uma anistropia reduzida, respeitem a causalidade e conduzam corretamente a dinâmica do Universo. Um outro ponto negativo é que esses modelos levam à equações dinâmicas bem mais complicadas do que as demais teorias.
Campos espinoriais
Eita nois, chegamos nessa parte horrorosa... Primeiro de tudo, eu já defini espinor, bem como cosmologia espinorial, nesse texto aqui, então corre lá dar uma lida.
Campos espinoriais, assim como campos vetoriais, são um pouco renegados na cosmologia, mas esses caras possuem uns resultados interessantes, vamos lá.
Campos espinoriais, assim como campos vetoriais, são um pouco renegados na cosmologia, mas esses caras possuem uns resultados interessantes, vamos lá.
No âmbito geral, campos espinoriais são capazes de realizar uma grande inflação cósmica redondinha, com exceção de um problema: os valores esperados do campo no vácuo do potencial cosmológico não são bem estabelecidos....
"tá... mas o que isso quer dizer ?" Isso quer dizer que a medida que o nosso campo físico, seja ele qual for, desce para o menor valor do potencial que guia a dinâmica cosmológica, a inflação cósmica acontece, pois esse campo libera energia para o Universo se expandir. Quando o campo atinge o menor valor do potencial ele precisa ter um valor bem definido e não conseguimos fazer isso com clareza para campos espinoriais.
Um ponto interessante que nós (eu e o Saulo) conseguimos mostrar, é que campos espinoriais possuem uma explicação física para existir a expansão cósmica, seja ela a grande inflação ou a expansão acelerada atual. Essa explicação se deve ao fato de que espinores devem respeitar o princípio de exclusão de Pauli, o qual diz que duas ou mais partículas fermiônicas não podem ocupar o mesmo estado quântico. Quando você tem um campo espinorial descendo para o menor valor de energia de um potencial, as partículas desse campo estão todas tentando atingir esse menor valor de energia, mas o princípio de exclusão impede isso, aí o que nosso sistema (Universo) precisa fazer, para acomodar essas partículas o mais próximo possível desse valor mínimo de energia, é causar uma expansão suficientemente grande, o que faz com que essas partículas fiquem estáveis em níveis de energia bem próximos. Isso é semelhante ao que acontece em uma estrela de nêutrons, por exemplo.
Em relação a expansão acelerada atual, espinores podem atuar como Energia Escura de duas formas: Como uma espécie de "quintessência"¹¹ e como constante cosmológica. Como CC é mais simples, simplesmente escolhemos um potencial cosmológico que não se anule quando campo espinorial desce para seu vácuo, isso permite que sobre um valor constante que atue exatamente como $\Lambda_{eff}$ discutido no primeiro tópico.
Já o comportamento estilo quintessência é bem mais complicado e possui vários problemas adicionais. Mas de forma geral o que você precisa saber é o seguinte: existe um campo espinorial cosmológico, ou seja, o comportamento dele afeta nosso Universo. Caso esse campo espinorial não tenha contribuído para a inflação cósmica, ele simplesmente está rolando bem lentamente para o vácuo de um potencial cosmológico, que é bem plano¹², e com isso está liberando energia para que o Universo se expanda de maneira acelerada.
Para o caso do campo espinorial ter atuado também na inflação cósmica, é necessário que sua dinâmica respeite um potencial mais complicado, com diferentes valores de vácuo, veja a imagem abaixo. Durante esse primeiro estágio, o campo desce para um falso vácuo de valor mais alto, causando a inflação cósmica e se mantendo lá por algum tempo. Após a inflação, sabe-se Deus o porquê, o campo pode tunelar quanticamente e descer para o vácuo verdadeiro, que possui menor energia. É na descida para o vácuo verdadeiro que o campo espinorial guiará a expansão acelerada atual.
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Potencial com falso vácuo (false) e vácuo verdadeiro (true). A bolinha representa um campo físico qualquer |
Se atente para algo legal: a expansão, seja ela qual for, acontece enquanto o campo rola em direção ao vácuo e acaba assim que essa região é alcançada.
Quais são os problemas com esses modelos? São vários, mas os principais, e mais fáceis de se entender são:
1 - No caso de modelos "tipo quintessência", temos problema de definição correta dos valores da massa do campo e da determinação dos valores esperados de vácuo em alguns modelos. Também existem problemas de o campo adquirir velocidades superiores a da luz, além de ajustes fino.
2 - Modelos de CC: Aqui temos novamente problemas de definição de valor massa e ajustes finos. Em alguns casos temos equações complicadíssimas para guiar a dinâmica do Universo, mas isso também vale para o caso anterior.
Gravidade modificada (TGM)
Graças a Deus tá acabando(!), mas esse tópico é o mais difícil de se discutir, pois existem MUITAS teorias de gravidade modificada, para tanto nos cabe apenas falar de aspectos gerais e muito superficiais, o que vai deixar esse tópico vago, mas vamos lá.
Teorias de gravidade modificada se baseiam em formas de alterar as equações de Einstein de maneira que expliquem a expansão acelerada atual sem a necessidade de CC ou Energia Escura. A forma de se fazer essas alterações vai depender muito de teoria para teoria (Eu discuti um pouco de teorias de gravidade modificada aplicadas à matéria escura nesse texto aqui).
Algumas TGM, por exemplo, dizem que a constante gravitacional $G$ na verdade varia a depender da região do Universo que você está, essas teorias recebem o nome de Teoria de Brans-Dicke. Por outro lado, algumas teorias fazem "correções de infravermelho" nas Equações de Einstein, que são correções que surtem efeitos somente nos dias atuais da vida do Universo. Para tanto, o escalar de curvatura $R$ das equações de Einstein é trocado para uma função de $R$, ou seja, $f(R)$. Com isso tudo no passado é descrito de forma exatamente igual a TRG, mostrando alterações gravitacionais apenas para a idade recente do Universo, que é quando a expansão cósmica acelerada se faz presente. A priori existem 3 tipos de teoria $f(R)$, que inclusive, são consistentes com a Teoria de Brans-Dicke.
Não importando de qual TGM estamos falando, antes de querer descrever a aceleração atual do Universo, esses modelos precisam passar pelos mesmos testes experimentais e observacionais da TRG. Isso significa descrever a física do sistema solar corretamente, descrever lentes gravitacionais, garantir a conservação de energia e momento (linear e angular) localmente, não pode ter objetos com velocidade maior que a da luz e etc.
TGMs até conseguem descrever de forma geral a expansão acelerada atual, mas sofrem também de problemas sérios, os principais são ajustes finos, que parece uma praga nos modelos cosmológicos, além disso existem problemas de instabilidade que podem ser vistos de duas formas distintas:
1 - apenas sobre condições muito bem estabelecidas esses modelos levam à expansão acelerada, pequenas variações nos parâmetros já cagam completamente o modelo.
2 - os parâmetros não são tão sensíveis assim, mas o Universo descrito por essas teorias são fortemente instáveis. Por exemplo, a instabilidade de Dolgov-Kawasaki mostra que algumas teorias f(R) colapsam muito rapidamente na presença de matéria, descrevendo Universos com intensas forças gravitacionais em momentos que isso não deveria acontecer.
Além disso tudo, em determinados casos, tais teorias sequer conseguem modelar a gravidade corretamente em regiões de pequena curvatura. Alguns modelos de TGM inclusive não conseguem descrever um Universo sem matéria escura, como também se propõem a fazer.
Quem está se saindo melhor?
Como vocês puderam notar, todas as nossas tentativas de modelar a expansão cósmica recente sofrem de sérios problemas. Entretanto as teorias que tem se mostrado mais aceitas, no âmbito cosmológico como um todo, são CC e campo escalar, mas é necessário pontuar algumas coisas. Primeiro que modelos cosmológicos guiados por campos escalares também podem estar associados a CC, pense no seguinte: o campo escalar faz a inflação cósmica, depois atua como matéria escura e existe uma CC que pode ou não estar associada ao campo escalar. Esse cenário é condizente com as observações e medições da polarização da radiação cósmica de fundo. Segundo, o campo escalar é mais simples que os demais, levando à equações também mais simples.
Os demais modelos de Energia Escura ou de modificação da gravidade, embora bastante estudados, ainda estão à margem quando comparado à cosmologia do campo escalar. Embora todos sofram de problemas sérios, o campo escalar e a CC possuem alguns pontos positivos, a simplicidade e maior naturalidade desses modelos pesam bastante, além de possuírem um caráter histórico e certo amparo observacional.
Por fim, nesse tópico sobre "se sair melhor" cabe-nos falar de algo muitoooo importante: "Como saber qual teoria está certa a partir de dados observacionais."
O campo escalar consegue muito bem modelar nosso Universo, mas não conhecemos nenhuma outra partícula escalar fundamental além do bóson de Higgs que, como já falamos exaustivamente, não pode ser responsável pela cosmologia. Então estamos num panorama que existe a necessidade de se distinguir, observacionalmente, um Universo guiado por campo escalar desconhecido daquele guiado por demais campos. Isso significa o seguinte: Em uma teoria que nosso campo espinorial, vetorial, escalar ou TGM faz a grande inflação cósmica, é importante tentarmos procurar por assinaturas desse modelo na polarização da radiação cósmica de fundo, caso não seja possível, fica inviável distinguir qual tipo de campo guiou o Universo naquela ocasião. Quando olhamos para modelos que tentam explicar a expansão acelerada atual o mesmo acontece, precisamos que esses modelos levem a Universos acelerados ligeiramente diferentes do campo escalar, para que possamos buscar essas peculiaridades nos dados colhidos e então diferenciar os campos.
Caso essas teorias não produzam pequenas diferenças observacionais, elas não precisam ser descartadas, mas teremos que encontrar formas indiretas para distingui-las, provavelmente por meio da física de partículas.
Como último adendo, é importante que você saiba que estamos muito avançados em "modelos" para explicar Energia Escura e a cosmologia de modo unificado. Aqui não falamos de muitas coisas importantes e interessantes, pois eu teria que escrever um livro sobre "Modelos Cosmológicos" para abarcar tudo que eu gostaria de falar (a ideia não é ruim). Hoje existem muitos modelos híbridos que trabalham com campos de diferentes naturezas acoplados e, dentro da quintessência e de campos vetoriais, é possível utilizar uma teoria chamada de "gravidade camaleão" que é muito interessante e não pudemos falar sobre. Muitas, mas muitas outras coisas que são igualmente interessantes e existem por aí ficaram de fora do "review". Portanto espero que você use esse texto como um direcionador para começar a entender um pouco melhor o assunto.
ACABÔÔÔÔÔÔÔÔ!!!!
acho que bati o recorde de maior texto do blog...
0 - Se você tem menos de 23 anos nunca deve ter ouvido falar em poupança do banco Bamerindus, então aqui tem 5 minutos de propagandas pra vc viver essa linda época.
1 - Não apenas energia, mas momento, cisalhamento e etc.
2 - Por "colapsar" entende que as galáxias que compõem o cluster deveria ir uma de encontro as outras, terminando na colisão de todas elas.
3 - Se a pressão comprime as coisas, uma pressão negativa faz o oposto, expande as coisas.
4 - Na verdade, um cientista chamado Vesto Slipher já tinha mostrado que várias galáxias pareciam se afastar da Terra, porém esse resultado era ainda desconhecido por Einstein e parte da comunidade acadêmica.
5 - O primeiro a mostrar um Universo expansivo utilizando as equações de Einstein foi de Sitter em 1917, porém seus trabalhos eram um tanto nebulosos e ficaram para escanteio na época. Além disso, o padre francês Lemeître também chegou aos mesmos resultados de forma independente mais ou menos na mesma época que Friedman.
6 - Como você é bastante inteligente deve estar se perguntando "Mas e a conservação de energia como fica nessa questão ?". O ponto central é que a energia não se conserva globalmente em TRG e esse assunto é bastante complicado de se discutir, pois está associado à base algébrica e geométrica da TRG. Nesse momento estamos escrevendo um artigo discutindo "conservação de energia em TRG e cosmologia" para a Revista Brasileira de Ensino de Física, depois que terminarmos eu faço um post aqui no blog explicando de forma mais "for dummies".
7 - Vácuo na mecânica quântica é diferente da mecânica clássica, aqui seu significado é de "menor energia" que seu sistema pode atingir. Então energia de vácuo, ou energia de ponto zero, é a menor energia do sistema. Fizemos uma longa discussão sobre isso no texto sobre o bóson de Higgs.
8 - Talvez você tenha se perguntado "você não precisaria de um teoria da gravidade quântica para estudar exatamente como a energia de ponto zero gravita?", não necessariamente, pois aqui estamos de fato acoplando matéria quantizada à gravitação clássica, isso é possível graças ao fato de que estamos trabalhando acima da escala de Planck e abaixo de energias altas suficientes para demandarem um Teoria de Tudo.
9 - Discutimos bem o que são campos escalares, vetoriais e spinoriais nesse texto aqui. Mas um ponto interessante é que nesse caso consideramos o potencial associado a campos escalares por simplicidade, mas eles poderiam de alguma forma serem potenciais associados a campos vetoriais, tensoriais, spinoriais e etc.
10 - O modelo de quintessência é modelo mais simples para o campo escalar, existem casos mais complexos como phantons e k-essence que não rola de discutir nesse texto.
11 - Coloquei entre aspas porque quintessência é para campos escalares, o que quero dizer aqui é que o campo espinorial atua diretamente expansão acelerada atual.
12 - Por "plano" entende que não é um potencial muito inclinado, ou seja, tem uma descida bem suave em direção ao seu vácuo.
Referências:
Energia Escura contexto geral:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-97332006000700002https://arxiv.org/pdf/1601.00329.pdf
https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/181695/guimaraes_tvm_dr_guara.pdf?sequence=3&isAllowed=y
Constante Cosmológica:
https://arxiv.org/pdf/1705.06294.pdfhttps://arxiv.org/pdf/1711.06890.pdf
https://arxiv.org/pdf/1502.05296.pdf
https://arxiv.org/pdf/1901.08588.pdf
https://sci-hub.tw/https://journals.aps.org/rmp/abstract/10.1103/RevModPhys.61.1
https://link.springer.com/article/10.12942/lrr-2001-1
https://link.springer.com/article/10.12942/lrr-2001-1
Campo escalar
https://arxiv.org/pdf/1308.4069.pdfhttps://arxiv.org/pdf/1503.05750.pdf
https://iopscience.iop.org/article/10.1088/1742-6596/761/1/012076/pdf
http://supernovae.in2p3.fr/~joyce/mjoyce_habilitation.pdf
https://arxiv.org/pdf/1610.08965.pdf
https://arxiv.org/pdf/1706.10211.pdf
http://inspirehep.net/record/1625060?ln=pt
https://arxiv.org/abs/1304.1961
https://arxiv.org/abs/0803.4076
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-97332000000200002
Campo vetorial
https://arxiv.org/abs/gr-qc/0701029https://arxiv.org/abs/0805.4229
https://ui.adsabs.harvard.edu/abs/2016gac..conf..135M/abstract
https://surface.syr.edu/cgi/viewcontent.cgi?referer=&httpsredir=1&article=1216&context=phy
https://journals.aps.org/prd/abstract/10.1103/PhysRevD.99.123521
Campo espinorial
https://arxiv.org/abs/1002.4230https://arxiv.org/abs/0906.1351
https://www.hindawi.com/journals/isrn/2013/374612/
https://www.researchgate.net/publication/45894009_Dark_Spinors
https://www.researchgate.net/publication/1917866_Dark_spinor_inflation_Theory_primer_and_dynamics
https://arxiv.org/abs/1811.00390
https://arxiv.org/abs/1702.07385
(Acabamos de terminar um review sobre cosmologia do campo espinorial, quando sair posto aqui)
Teorias de gravidade modificada.
https://arxiv.org/abs/1309.3523https://arxiv.org/abs/gr-qc/0607124
https://arxiv.org/pdf/1811.03964.pdf
https://arxiv.org/abs/1503.07412
https://arxiv.org/abs/1811.00390
https://arxiv.org/abs/astro-ph/0610734
https://arxiv.org/abs/1212.4928
https://www.researchgate.net/publication/225464491_Conditions_and_instability_in_fR_gravity_with_non-minimal_coupling_between_matter_and_geometry
https://arxiv.org/pdf/gr-qc/0611107.pdf
quarta-feira, 27 de novembro de 2019
Posted by
Thiago V. M. Guimarães
Bóson de Higgs - Hangout e Medições
Eu tinha prometido a vocês que nesse final de semana eu postaria a
segunda parte do meu texto sobre o bóson de Higgs, porém eu participei de um hangout com vários colegas e abordamos alguns assuntos pertinentes sobre o Higgs, então o post de hoje será o vídeo e comentários pessoais sobre o assunto, mas fique atento que tem um "extra" sobre medições e precisões.
Então vamos lá:
00:00 -- 00:02
Um monte de gente que não sabe nem onde achar o
link do próprio Hangout, ok, a lagrangiana do modelo padrão é mais
simples de mexer.
00:02 -- 00:08
Introdução, apresentação e o Daniel fez o favor de esquecer que eu também trabalho com o Higgs e fui reduzido a ajudante (rs).
00:09 -- 00:12
O comentário da Flávia foi excelente e carregado de informações. Mas vamos comentar com um pouco mais de calma para quem não entendeu. CERN é a Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear. Assim como qualquer grande organização ela possui diversas linhas de pesquisas em diversos campos da física de partículas, um deles é a medicina nuclear por exemplo, então o CERN não é um lugar restrito a procurar o bóson de Higgs. LHC - Larger Hadron Collider (Grande Colisor de Hadrons) - é o famoso acelerador/colisor de partículas que está localizado no CERN. Nesse colisor existem diversas experiências sendo feitas, como
o estudo de plasma de quark e glúons, que estuda um tipo de matéria que muito
provavelmente se assemelha ao nosso universo nos seus instantes iniciais, essa pesquisa não está diretamente relacionada ao Higgs, mas foi ela quem deu origem as analogias de que o LHC iria "recriar" o universo. As demais pesquisas a Flavia deixou bem claro no comentário, mas acho um ponto interessante é que não foram feitas apenas experiências com colisões de prótons, mas também com íons pesados, como o de chumbo.
Por sua vez o LHC tem 6 divisões e cada divisão estuda coisas determinadas. Por exemplo;
ALICE - Estuda as colisões de íons pesados, como é o caso dos íons de chumbo. É aqui que o plasma de quarks e glúons é estudado.
ATLAS
- Estuda várias coisas, dentre elas o Higgs, supersimetria, matéria escura e etc.
CMS - O propósito é parecido com o do ATLAS. O foco da pesquisa é no Higgs, física além do modelo padrão e alguns aspectos da colisão de íons pesados.
CMS - O propósito é parecido com o do ATLAS. O foco da pesquisa é no Higgs, física além do modelo padrão e alguns aspectos da colisão de íons pesados.
LHCb
- Nesse experimento é onde acontece o estudo da física de "b's"
que a Flávia cita. O foco aqui é o estudo de partículas conhecidas
como B-mésons, que decaem em quarks e antiquarks beauty.
LHCf
- Estuda aspectos semelhantes a raios cósmicos encontrados nos LHC
que poderiam ajudar os físicos a calibrar sensores de experiências
gigantescas relacionados a raios cósmicos e interpretar seus
resultados.
TOTEM
- Essa pesquisa visa estudar aspectos como o tamanho de um próton e
algumas propriedades do próprio acelerador.
Quem trabalha nessas pesquisas não
são pesquisadores solitários, mas sim grandes grupos que geram uma
quantidade enorme de publicações anualmente, assim as publicações
(descobertas), levam o nome do grupo todo.
00:13 -- 00:024
Fermilab, ao qual o Rafael se refere e trabalha, é um instituto de pesquisa dos EUA, onde várias pesquisas relacionadas a física de partículas são feitas. Até pouco tempo atrás ele possuía seu próprio acelerador, Tevatron, que foi desligado. Porém ainda sim o Fermilab trabalha em colaborações no Cern, como Rafael mesmo falou.
Acho que não preciso falar nada sobre o que eles disseram sobre as associações e sobre as cagadas que o Brasil está fazendo em relação a sua parceria com CERN, caso vocês queiram saber mais sobre isso, uma rápida pesquisa no Google e vocês já acham bastante notícias.
00:26 -- 00:31
Essa parte da introdução a teoria de Higgs eu descrevi bastante nesse post: Bóson de Higgs - Como, onde e porque surgiu. Então não vou falar
novamente.
Um ponto que eu acho que vale a pena falar um pouco é sobre o que a Ana Carolina diz que o Higgs encontrado pode não ser o previsto pelo Modelo Padrão. Essa parte é meio confusa, pois se a gente previu algo lá, como é possível não ser exatamente o que a esperávamos? Acontece que nem sempre é possível prever todos os comportamentos de algo apenas teoricamente, muitas vezes nossas teorias não são completas, ou nós cometemos erros, então observar algo onde deveria estar o bóson de Higgs já significa que uma parcela da nossa teoria está correta, encontrar todas as propriedades prevista significa que até aquele ponto nosso poder de predição foi de 100%. Se encontramos mais propriedades, então significa que não estamos considerando alguma coisa significativa, ou nossa teoria é limitada ou então nós estamos errando em algum ponto importante. Com isso é possível que saibamos onde algo está, embora não acertemos na predição de todas a suas propriedades, o que por si só já escancara a necessidade do estudo experimental do assunto.
00:31 -- 00:38
A explicação da Ana aqui foi muito boa, mas como deu uma discussão no final pode ter complicado um pouco o entendimento.
Como a própria Ana diz, bosons fazem interações entre partículas, enquanto essas partículas são os férmions. Mas para não ficar abstrato tentarei ser mais direto e não muito técnico. Bósons não são matéria propriamente dita, possuem spin inteiro e obedecem a estatística de Bose-Einstein. Já os férmions são partículas de matéria propriamente dita, possuem spin semi-inteiro e obedecem a estatística de Fermi-Dirac. Para maiores explicações sobre isso veja essa série de textos:Matéria
e Energia - Diferenças que você precisa saber!
Se você veio aqui para entender sobre o que o Daniel disse sobre vácuo e Higgs, veja o texto sobre o bóson de Higgs que linkei no tópico acima.
00:38 -- 00:41
O que é spin, esse ponto é terrível, por isso eu passei a bola no Hangout, mas vamos tentar por aqui. O exemplo da Ana é muito bom para a situação, porém é importante que você lembre que partículas são pontuais, elas não são corpos extensos para terem rotações. Então o que estamos falando aqui é sobre algo sem dimensão que gira, então na realidade não temos um corpo girando, mas sim um objeto (uma partícula) que possui propriedades de um corpo que está girando. Isso é muito abstrato, pois o que eu estou dizendo é que um corpo tem propriedades de giro, mas não podemos dizer que ele está girando, pois ele nem sequer possui dimensões. Então entenda o spin como sendo um número que pode ser inteiro 0,1,2,3... ou semi-inteiro 1/2,/3/2... que está associado intrinsecamente a cada tipo de partícula, e esse número confere à essas partículas propriedades físicas distintas.
00:41 -- 00:48
Essa parte sobre o Higgs ser ou não o do modelo padrão, acho que ficou bem claro, a Ana, o Daniel e a Flávia explicaram muito bem.
00:49 -- 00:52
MeV e GeV que a Ana fala são medidas de energia/massa e significam Mega elétron Volt e Giga elétron Volt, respectivamente.
00:53 -- 00:59
A única coisa que tenho a dizer desse ponto é sobre o que a Flávia não definiu; energia hadrônica é a soma da energia de todos os hádrons produzidos numa colisão.
A única coisa que não foi discutido nesse hangout e que eu gostaria de falar é sobre a precisão das medidas realizadas e como elas funcionam. Você deve ter ouvido falar há algum tempo atrás que conseguiram 5 sigmas na descoberta do Higgs e depois esse valor subiu para 5,7 sigmas, mas o que é isso e como isso é calculado?
Como ficou bem claro para você (assim espero), nós não vemos na tela do computador uma partícula, como Higgs, bonitinha lá parada, nem nada próximo disso. Nossa detecção é sempre de efeitos secundários, como o decaimento do Higgs em dois fótons ou em outras partículas. Mas a coisa ainda é mais complicada que isso, pois não colidimos um par de prótons e aparece um Higgs, o que temos é a colisão de feixes compostos por uma quantidade absurda de prótons e que fornecem uma quantidade ainda mais absurda de dados, e deveria existir uma grande quantidade de bósons de Higgs aparecendo no meio desses dados. Então o que temos para analisar são muitos, mas MUITOS dados armazenados, é nessa análise que procuramos por dados que correspondem ao bóson de Higgs. Nosso foco aqui será entender como essa análise é feita.
(oh meu Deus, um físico teórico vai falar sobre física experimental – desculpe, mas é o que tem para hoje).
Quando se realiza experimentos do tipo do Higgs, o mais comum é utilizar uma ferramenta estatística chamada de valor-p (p-value), que é basicamente a probabilidade estatística de encontrarmos dados extremos mesmo que não exista nada de importante acontecendo. Tentando ser mais claro, a lógica geral é algo assim:
1 – Considera-se que o Higgs e partículas tipo-Higgs não existam. (Isso mesmo, considere que não exista o Higgs)
2 – Calcula-se a probabilidade de se observar resultados semelhante a um sistema em que o Higgs não exita, esse é o valor-p.
Dê uma olhada nesse gráfico abaixo;
Nele você pode ver dados preliminares obtidos pelo experimento ATLAS. No eixo horizontal temos a energia que foi utilizada nesse experimento e o eixo vertical é a medida de um número de detecções de uma certa configuração de partículas. O valor-p, no gráfico, é a linha pontilhada, por sua vez a linha contínua com pontinhos pretos são os valores experimentais obtidos. A faixa verde corresponde a um desvio padrão de medida para mais ou menos 1 sigma, e a faixa amarela para mais ou menos 2 sigmas. Sendo assim, quanto menor o valor de sigma, mais próximo do valor-p estão os dados colhidos e com isso menor a confiança em saber se aquilo é de fato uma partícula nova ou não. Na imagem, circulado em vermelho estão os resultados com 2,7 sigmas, ou seja 2,7 acima do valor-p e com isso podemos começar a afirmar que os dados esperados se o Higgs não existisse não batem com os dados obtidos no LHC.
Aqui gostaria de colocar um enorme asterisco: O
valor-p NÃO é um falso-positivo, mas sim à probabilidade de obter um determinado resultado sem haver algo de
especial acontecendo.
Como os cientistas são exigentes, eles só aceitam que uma partícula é de fato encontrada para valores acima de 5-sigmas.
Esse valor, diferente do que muitos blogs e sites de notícias por aí afirmam, não significa que a probabilidade de não ser o Higgs é de 1 em 3.500.000. Mas sim que a probabilidade de obter um valor que não esteja relacionado ao Higgs é de 1 em 3.500.000.
3 – Se os dados obtidos são extremamente improváveis considerando que uma partícula do tipo-Higgs não exista, então podemos dizer que o pressuposto de não existência dessa partícula é falso. Com isso passamos a ter uma base experimental para apostar na existência de partículas desse tipo.
Mas agora como sabemos que ali está uma partícula tipo-Higgs e não uma outra? Quanto o valor obtido experimentalmente tem que divergir do valor?
Essa pergunta é difícil e complicada de responder, mas nesse caso tudo começa pela massa. A massa esperada para o Higgs está por volta de 120 - 150 GeV, então se obtivermos um excesso confiável em 125 GeV por exemplo, podemos dizer que encontramos alguma partícula com massa na faixa da partícula de Higgs, porém é preciso determinar outras coisas, como o spin por exemplo, que para o caso de Higgs deve ser 0 (um bóson escalar), existem alguns métodos interessantes sobre como fazer isso, mas isso é um assunto bem mais complicado e você pode ver mais sobre ele aqui.
No dia 04 de Julho de 2012, a página do CMS
publicou uma nota sobre excessos exatamente em 125 Gev:
CMS observes an excess of events at a mass of approximately 125 GeV with a statistical significance of five standard deviations (5 sigma) above background expectations. The probability of the background alone fluctuating up by this amount or more is about one in three million. The evidence is strongest in the two final states with the best mass resolution: first the two-photon final state and second the final state with two pairs of charged leptons (electrons or muons).
E então fica mais claro o que estamos falando, em uma tradução literal, temos:
CMS observa um excesso de eventos em uma massa de aproximadamente 125 GeV[1] com uma significância estatística de cinco desvios-padrão (5 sigma)[2] acima das expectativas de fundo. A probabilidade de o fundo sozinho atinja este valor ou mais é de uma em três milhões. A evidência é mais forte nos dois estados finais com a melhor resolução em massa: primeiro o estado final de dois fótons e segundo o estado final com dois pares de léptons carregados (elétrons e múons).
Isso significa que os dados colhidos no CMS deram uma grande quantidade de eventos na faixa de energia de 125 GeV, que está na faixa da massa do Higgs. A significância estatística de 5 sigma significa que a chance dos ruídos de fundo sozinhos produzam o resultado observado (se o Higgs não existisse) é de uma em mais de 3 milhões. Note que não estão falando de a chance de o Higgs existir, mas sim de nós conseguirmos obter esses dados sem que o Higgs exista.
Muito provavelmente, aqui você já conseguiu notar que o que é feito é um cálculo da probabilidade dos dados obtidos serem de origem não especial, ou seja de não ser o Higgs nem nada inesperado. Aí comparamos a relevância dessa probabilidade que chamamos de valor-p com os dados obtidos, se a probabilidade do valor-p bate com os excessos observados então não podemos afirmar nada, se o valor-p é muito(!) pequeno comparado aos dados obtidos então podemos dizer que o valor-p não explica esses dados, assim deve haver uma causa especial para aqueles excessos, no caso o Higgs. Se você entendeu isso, we're done here!
Mas beleza, qual a relação disso com a probabilidade de se obter o Higgs de verdade?
Para entendermos isso, temos primeiro que entender o que é o sigma, ou o “desvio padrão”, que tanto falamos.
Eu roubei esse gráfico acima de um site que tem uma explicação muito boa, veja aqui. Nele nós vemos uma coisa muito famosa para qualquer pessoa que em algum momento da vida já teve que estudar estatística, a curva Gaussiana! A parte mais protuberante do gráfico é o que chamamos de media, e o valor de sigma é quanto nossa medida desvia dessa média. A probabilidade de se obter um valor próximo a média (nesse caso é o nosso valor-p) é de 68%, isso equivale a 1 sigma. Ou seja, 32 a cada 100 dados registrado é em decorrência de nada
importante . Para 2 sigmas apenas 5% dos dados podem ter origem em nada espacial, ou seja, pode ter origem nos ruídos de fundo das colisões. Para 5 sigmas, a chance de os dados serem de proveniência de nada em especial (nenhum evento do tipo Higgs) é de 0,00006%, sendo assim é quase impossível que não seja uma partícula nova.
Para o bóson de Higgs conseguiu-se 5,9 sigmas, o que equivale a cerca de 0,000001% de chance de os dados não terem origem devido ao Higgs. Com isso podemos afirmar com muito boa precisão que encontramos de fato uma partícula tipo-Higgs lá, o que vem se
confirmando (como dito no hangout) ser o bóson de Higgs esperado pelo modelo padrão.
01:10 -- 01:11
A Ana deu uma resposta muito boa para simetria, de forma correta e simples, caso você queria ver uma explicação mais técnica sobre isso, mas ainda sim sem matemática, veja o texto "Bóson de Higgs - Como, onde e porque surgiu."
01:12 -- 01:14
A Teoria Quântica de Campos nos fez ver um universo todo permeado por campos que dão origem às partículas que formam tudo a nossa volta. Por exemplo, em todo o universo, há um campo chamado de “campo de elétrons”, que é um campo fermiônico que citei no texto sobre Matéria
e Energia. Um elétron propriamente dito não é um campo, mas sim uma vibração localizada em um campo. Sendo assim, cada elétron que existe é uma vibração localizada em um único campo.
Os elétrons não são as únicas partículas que consistem em vibrações localizadas de um campo, na verdade todas as partículas são. Por exemplo, há um campo de fótons, um campo de quark up, um campo de glúons, um campo de múon, ou seja, há um campo para cada partícula conhecida. E, para todos eles, uma partícula é apenas uma vibração localizada do campo. Caso você queira saber um pouco mais sobre esse assunto, veja esse texto:Campos e Partículas - A Nossa Visão Moderna do Universo.
01:14 -- 01:24
note que aqui o Daniel deixa claro, logo de início, que é tudo especulação, ou seja, não possuímos dados ou evidências sólidas daquilo que está sendo discutido. E também ressalto, até o presente momento não há relação alguma entre o bóson de Higgs e o Big Bang.
01:24 -- 01:54
Não vou comentar os pontos finais porque eu pretendo escrever unicamente sobre eles, já que acho muito interessante tratar com cuidado sobre a importância da busca do conhecimento em ciência de base e como isso se relaciona com aplicação em tecnologia.
Então caso sobre alguma dúvida mande para nós.
É isso gente, espero que todos tenham gostado e até a próxima.
sexta-feira, 25 de outubro de 2013
Posted by
Thiago V. M. Guimarães
Entrevista sobre o Bóson de Higgs - ou um duelo entre jornalismo e informação?
Olá pessoal, não ia escrever um texto antes de sexta, mas quero falar acerca da entrevista que o Rogério Rosenfeld, do IFT, deu à emissora Bandeirantes no domingo. Os vídeos estão logo abaixo (linkei só a parte 1 de 4) e também indico que primeiro vocês leiam esse texto do Daniel, que foi o "muso" inspirador desse texto (kkkkkk).
Assisti a entrevista ontem, pelo canal do youtube do qual linkei o vídeo acima. Como eu estava de mal comigo mesmo e queria me autoflagelar, resolvi ler os comentários. Então o contexto total me deu vontade de escrever um texto abordando a postura do Rosenfeld, dos jornalistas e do pessoal que estava assistindo e criticando.
A entrevista já começa com um vídeo legalzinho, mas cheio de imprecisões. Obviamente a emissora não iria querer gastar mais dinheiro pagando alguém que entendesse do assunto para dar consultoria no vídeo, já que qualquer estagiário de jornalismo pode ler meia dúzia de textos e entender tudo do assunto. Afinal, o Higgs é totalmente trivial, uma partícula gorda que gruda em todas as outras partículas e dá massa para elas, cria o universo, passa café e faz bolo de chocolate.
Tirando o bonito e desastroso início, começa a entrevista. Parecia que eu estava assistindo um duelo de repentistas; os jornalistas perguntavam algo e esperavam respostas imediatas, “sim”, “não”, “o bóson de Higgs é isso”, o “bóson de Higgs é aquilo”... Porém, como o Daniel deixou bem claro no texto dele, na Ciência as coisas não são bem assim, principalmente se tratando de um assunto tão recente e complexo. Como vocês devem ter notado no meu texto anterior, o bóson de Higgs não é trivial, não se formula uma resposta exata “o bóson de Higgs é isso” e todo mundo compreende sem problema algum. Infelizmente na “física de ponta” muitas coisas que parecem triviais já deixarem de ser simples há muito tempo, como o caso da massa, que eu também escrevi a respeito.
Outro exemplo é a própria definição do que é matéria ou o que é uma partícula. Se um físico me perguntasse agora o que é uma partícula, eu conseguiria dar uma resposta concisa: responderia “na lata” que é uma representação irredutível do grupo de Poincaré. Um físico compreenderia sem problema algum, mas e para você que sentido isso faria? Muito provavelmente não faria nenhum sentido, afinal o que é uma representação irredutível, o que é um grupo de Poincaré? Quem ou o que diabos é Poincaré? Obviamente, para explicar a um “não especialista”, eu precisaria pensar em uma forma mais didática de abordar o assunto e, ainda sim, sem muita imprecisão.
Isso, por si só, já é uma tarefa muito difícil se tratando de assuntos consolidados, que todo mundo conhece dentro da física. Imagine agora responder perguntas referentes a algo que acabou de ser sistematizado, que pode ter relação com mais coisas do que sabemos, que pode ter propriedades levemente diferentes do esperado. Uma resposta concisa seria um erro tremendo.
Outro problema contundente eram as perguntas que vinham de jornalistas leigos. Via-se que o pobre Rosenfeld tinha que entender a pergunta e tentar consertar ela para que, aí sim, pudesse formular uma resposta simples e didática de algo complexo que está na fronteira do conhecimento humano.
Nesse meio tempo entre a compreensão, correção e resposta à pergunta, os jornalistas já estavam interrompendo o entrevistado com novas perguntas e indagações que algumas vezes sequer havia relação com a pergunta que ele estava tentando responder.
Aí vem aquela máxima: “Ah Thiago, você está sendo injusto, os jornalistas são pressionados para escrever, por quantidade de conteúdo em um tempo apertado, mimimi...”. Sim eu sei disso, e gostaria agradecer a essas empresas de jornalismo que estão preocupadas unicamente com lucro e não com qualidade de informação passada, pelo desserviço muitas vezes prestado à divulgação científica. Embora eu ache que a atitude da Bandeirantes, em abordar o tema, tenha sido algo muito legal, notava-se que a emissora não tinha nem ao menos UM repórter capacitado para tal entrevista, o que jogava toda a responsabilidade nas costas do Rosenfeld.
Uma coisa que eu gostei muito foi o desanimo dos entrevistadores logo no começo quando receberam a resposta de que o Higgs não tinha aplicação prática no momento. Esse ponto é algo muito delicado, pois nossa atual sociedade sente uma enorme dificuldade em achar utilidade para o conhecimento que não desenvolva imediatamente tecnologia. O aperfeiçoamento da nossa forma de ver e compreender o universo, a evolução da nossa compreensão de mundo são totalmente inúteis se não der para fazer um Iphone com bateria que dure mais tempo.
Mas enfim, esse é o mundo que vivemos e muitas vezes temos que tentar “vender nosso peixe” e forçar a existência de supostas tecnologias que podemos construir com o Higgs.
Agora vamos ao nono ciclo do inferno... digo, ao comentários:
Tanto no facebook quanto no youtube as opiniões foram deprimentes, basicamente me deparei com a justiça do inferno:
1 – A Malícia
Comentários puramente maldosos, com única intenção de atacar o entrevistado que não correspondeu ao esperado; “de que adianta ter 50 diplomas e ser um mané que não sabe explicar nada” e coisas do tipo.
O Rogério soube sim explicar muito bem algumas coisas, o problema foi que ele nem ao menos teve tempo para pensar em respostas melhores e mais amplas, pois era sempre atropelado por um jornalista com uma pergunta quase sempre sem muito sentido.
2 – A incontinência
“O Gleiser é melhor, deveriam ter chamado ele”, “Ele é bom, mas preferia o Gleiser”.
Tá, aí é uma questão de opinião. Mas é justamente esse ponto que difere Rosenfeld de Marcelo Gleiser. Rosenfeld se enrolou um pouco, gaguejou, demorou a responder, mas percebi que ele fez isso diversas vezes na tentativa de dar a melhor resposta possível para a pergunta, muitas vezes sem sucesso, devido a falta de rivotril nos jornalistas.
O Marcelo Gleiser por sua vez, não é tão cuidadoso com as suas palavras, aí o pessoal gosta mais, pois você não precisa pensar muito para entender uma resposta dele. Mas isso é um problema, muitas vezes o Gleiser é impreciso a ponto de estar errado, mesmo a explicação dele sendo didática e legal. Então preste atenção, a resposta que você quer muitas vezes pode estar errada, principalmente se tratando de Ciência.
3 – A Bestialidade
Sem dúvida o maior reflexo dos comentário na internet, ninguém nunca conseguirá escapar deles. Mas como sempre, nesse caso só podemos sentir pena dessas pessoas que precisam se comportar como animais, ou como “vermes de comentário”.
Para fechar vou resumir exatamente o que eu achei de tudo isso: gostei bastante da entrevista, acredito que foi bastante válido a emissora ter aberto espaço para um assunto importante para a Ciência, e adoraria que as demais emissoras fizessem o mesmo. A postura dos jornalistas foi algo muito prejudicial para o desempenho do entrevistado, que não pode se expressar corretamente, ou a altura da capacidade que possui. As emissoras deveriam se preocupar mais com isso. Apesar dos pesares, as respostas do Rogério foram muito boas, algumas vezes não muito didáticas, mas ao menos ele não foi impreciso em alguns pontos que outros divulgadores como Gleiser e Kaku nem se importariam.
terça-feira, 15 de outubro de 2013
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Thiago V. M. Guimarães
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Bóson de Higgs - Como, onde e porque surgiu.
Mudança total de planos. Essa semana Peter Higgs ganhou o prêmio por causa do bóson de Higgs e a mídia fez uma cagada monstruosa ao tentar noticiar o assunto. A coisa foi tão feia que o bóson de Higgs acabou sendo até o responsável pela vida na Terra. Obviamente que eu estava doido para escrever um texto metendo o pau nos jornalistas, mas vou fazer melhor, vou dissecar o assunto ao máximo para os leigos. Farei isso em alguns posts, basicamente já tenho tudo escrito só vou postando aos poucos para não ficar gigante.
Para não comprometer o entendimento de todos, esse texto será divido em 3 partes;
1 – Introdução,
2 – O Higgs para leigos,
3 – O Higgs para não tão leigos.
0 – O porquê:
Esse texto possui uma motivação extra. Vocês que acompanham o blog sabem que eu trabalho com Teoria Quântica de Campos, mas nunca falei exatamente em quê. Minha pesquisa é em uma área relacionada ao Higgs, trabalho com vórtices semilocais no modelo de Higgs não-abeliano, não se preocupe se você não entendeu nada, acho que nem eu entendo direito. Essa área trabalha diretamente com o campo de Higgs, embora eu não pesquise diretamente a fenomenologia da partícula em si. Como vários pesquisadores da área de partículas e campos que trabalham diretamente com modelos de Higgs não se manifestaram sobre o assunto, me senti na obrigação de escrever esse texto. Então lá vamos nós:
0 – O porquê:
Esse texto possui uma motivação extra. Vocês que acompanham o blog sabem que eu trabalho com Teoria Quântica de Campos, mas nunca falei exatamente em quê. Minha pesquisa é em uma área relacionada ao Higgs, trabalho com vórtices semilocais no modelo de Higgs não-abeliano, não se preocupe se você não entendeu nada, acho que nem eu entendo direito. Essa área trabalha diretamente com o campo de Higgs, embora eu não pesquise diretamente a fenomenologia da partícula em si. Como vários pesquisadores da área de partículas e campos que trabalham diretamente com modelos de Higgs não se manifestaram sobre o assunto, me senti na obrigação de escrever esse texto. Então lá vamos nós:
1 – Introdução:
Nós sabemos que a matéria é formada por átomos e há não muito tempo se descobriu que os átomos são compostos de outras partículas menores, como os elétrons, prótons e nêutrons. Mais recentemente ainda, se descobriu que o próton e o nêutron poderiam ser divididos em partículas ainda menores, chamadas de quarks. No decorrer do século passado foi descoberto um grande número de partículas novas que possuíam propriedades características diferentes entre si. Os físicos viram então a necessidade de organizar seu grande armário de partículas elementares para a coisa não ficar bagunçada.
As partículas fundamentais foram dividas em dois grandes grupos chamados de Férmion e Bóson. Esses dois grupos são fundamentalmente diferentes. O primeiro é composto por partículas de matéria propriamente ditas (SIC) e possui spin semi-inteiro, 1/2, 3/2, 5/2, por exemplo. Dentro desse mesmo grupo as partículas são divididas em 12 subclasses chamadas de sabores. Entre essas partículas estão os elétrons, vários sabores de quarks e de neutrinos. Quando juntamos esses quarks eles formam partículas maiores chamadas de hadrons – que é exatamente o que significa aquele H do LHC – que compreendem os prótons, nêutrons e píons, basicamente.
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Imagem com Bosons Hadrons e Fermions. |
Por sua vez o grupo dos bósons é composto de partículas que, de forma geral, são mediadoras de campos e possuem spin inteiro, 0,1,2. Os bósons com spin 1 são chamados de bósons vetoriais, pois são provenientes de campos vetoriais. Os bósons de spin 2 são tensoriais (provenientes de campos tensoriais) e os bósons de spin 0 são chamados escalares (provenientes de campos escalares). Dentro desse grupo temos o fóton, que é o mediador de interações eletromagnéticas, o glúon, os bósons Z e W que são responsáveis pela mediação da força nuclear fraca e bóson de Higgs, que por sua vez é mediador de uma interação de massa.
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Modelo padrão. |
Quando juntamos todas essas partículas fundamentais e as interações que elas representam, temos um zoológico de partículas e interações chamado de “Modelo Padrão”. Esse modelo é muito bonito e funciona muito bem, é quase como uma tabela periódica dos físicos de partículas. Mas existe um “porém” nessa beleza toda, falta uma partícula para fechar esse modelo, o maldito bóson de Higgs. Tão maldito que o físico norte americano Lederman escreveu na década de 90 um livro chamado The Goddamn Particle, "A partícula maldita" em uma tradução literal, mas os editores acharam mais legal trocar o nome para The God Particle, A Partícula Deus. Como era de se esperar foi uma cagada homérica que só deu dor de cabeça para os físicos.
2 – Higgs Para Leigos (e para jornalistas)
Mas enfim, que diabos é essa partícula exatamente? Obviamente a resposta correta e formal para essa pergunta exigiria uma boa quantidade de matemática, então isso fica para a seção 3. Aqui irei me ater a uma explicação superficial, mas ainda sim dentro da margem do que se considera correto.
Nossa charmosa teoria que descreve as interações entre as partículas e forças funciona muito bem, mas existe um problema que tira o sono de muitos cientistas. A teoria diz que as partículas não deveriam ter massa e, portanto viajar a velocidade da luz, como acontece com o fóton. Entretanto, as partículas que conhecemos têm massa, então alguma coisa deve estar errada ou não estar sendo considerada nesse modelo. Para sanar o problema algumas propostas surgiram, entre elas uma bem elegante dizia que existia um campo responsável por frear essas partículas e esse freamento poderia ser entendido como a “massa” dela. E se produzíssemos uma perturbação nesse campo iríamos gerar ondulações que na teoria quântica de campos são vistas como partículas. Então, chama-se as oscilações no campo de Higgs de bóson de Higgs e é exatamente isso que o LHC tenta fazer, criar essas perturbações no campo.
Assim, a grosso modo, o bóson de Higgs é responsável pela massa das partículas, mas existe um pequeno misconception passado por muitas pessoas nesse ponto e que pode surpreender você. A existência do bóson de Higgs nos mostraria a origem direta da massa de apenas uma pequena parte das partículas que conhecemos, como o elétron, e não de TODA a matéria do universo. Porém, mesmo que a massa de outras partículas, como o próton, tenha origem em grande parte na força nuclear forte elas são afetadas diretamente pelo campo de Higgs (note que falei campo e não bóson), assim podemos considerar que estudos sobre o campo e o bóson de Higgs têm efeitos praticamente sobre toda a matéria ordinária que conhecemos. Caso você queira uma segunda explicação bem didática veja esse texto: Dossiê Higgs
A busca pela partícula maldita começou antes do LHC, no acelerador Tevatron que funcionou até 2011 no Fermilab, EUA (eu particularmente tinha uma questão de feeling com esse). No final da década de 90 e começo de 2001 esse acelerador passou por algumas modificações para realizar o seu Run II que durou até encerrar suas atividades em 2011. Um de seus programas era estudar o quark Bottom, porém houve a possibilidade de se estudar o bóson de Higgs associado aos bósons W e Z, uma vez que o Higgs decaía em quarks bottom. No geral o estudo foi um grande sucesso tanto para os quarks bottom quanto para o bóson de Higgs. Na física de partícula a confiança estatística de que a partícula exista é dada em sigmas, quanto maior o sigma melhor, mas a partir de 5σ já é possível anunciar a descoberta de uma nova partícula, por sua vez o Tevatron conseguiu 3σ para o bóson de Higgs.
Nesse tempo de árduo trabalho do Tevatron, o LHC ficou pronto e como trabalha com energia, intensidade mais altas e com detectores melhores, a chance de se obter uma medida mais precisa que 3σ era bem maior. E foi exatamente isso que aconteceu, no dia 4 de julho os cientistas anunciaram a significância combinada de 5σ e dias depois subiram para 5.9σ. Ou seja, encontraram algo bem na faixa de energia onde o safado do bóson de Higgs deveria estar. Além dessa ótima notícia teve também a enxurrada de cagadas jornalísticas que despertaram a fúria de alguns cientistas, até a emissora de TV Al Jazira falou enfaticamente sobre o assunto e muitos sites intitularam seus artigos de “Encontraram a partícula de Deus”.
3 – Higgs para Não Tão Leigos.
Após essa introdução vamos nos aprofundar um pouco mais no assunto. Aqui nós seremos levados a caminhos sombrios e muito bonitos da área de partículas e campos. Minha intenção é expor com maior número de detalhes possível o porque, onde e como surgiu o bóson de higgs. Indico as (muitas) linhas abaixo apenas a quem está disposto a entender o assunto de verdade, vai depender de seu esforço de absorver o que escreverei, pois não é nada trivial, embora seja deverás interessante. Não deixe de ler todos os textos linkados e também as referências.
3.1 – Quebra de Simetria Eletrofraca.
Antes de começarmos, dê uma lida nesse texto aqui: Campos e Partículas. Eu vou partir desse princípio.
O primeiro ponto a ser tratado é o que é a teoria eletrofraca e o que é uma quebra de simetria eletrofraca. Partiremos desse ponto pelo fato de o mecânismo de Higgs, que é o mecânismo com que algumas partículas ganham massa, ser uma quebra de simetria eletrofraca no modelo padrão.
Então, cabe a nós agora entendermos como funciona a quebra de simetria eletrofraca no modelo padrão.
Anteriormente abordei no texto sobre matéria e energia, que o que consideramos matéria propriamente dita são os férmions, que como você sabe temos como exemplo os quarks e elétrons, entre várias outras partículas. Os quarks interagem fracamente, fortemente e eletromagnéticamente, enquanto os léptons, como o elétrons, não interagem pela força forte. Em todo o caso, as interações fracas e eletromagnéticas de ambos os quarks e léptons são descritos de forma (parcialmente) unificada pela teoria eletrofraca. Resumindo, a teoria eletrofraca é basicamente a unificação da força nuclear fraca com a força eletromagnética.
Ok, onde entra a simetria nisso?
Podemos dizer que o universo ama simetrias, e a grande matemática Noether conseguiu mostrar que simetrias estão matematicamente relacionadas à conservações de propriedades como a carga elétrica, por exemplo. Mas que tipo de simetria são essas? Podemos dividir as simetrias nas leis da física em duas, as Globais e as Locais. Simetrias Globais são aquelas aplicadas uniformemente sobre todos os pontos do espaço. Se pegarmos um balão e marcarmos seus meridianos e paralelos (como na imagem a baixo), ao girarmos esse balão no seu eixo, por exemplo, veremos que a nova posição do balão é idêntica a primeira, isso porque todos os seus pontos foram girados de forma igual, sendo assim todos os pontos sobre o balão sofrem o mesmo deslocamento angular, essas simetrias são as que levam à conservação de cargas. As simetrias locais (também conhecidas como Simetria de Gauge¹) são aquelas aplicadas a cada ponto do espaço, tomando a mesma linha do exemplo anterior, é como se a simetria de local fizesse o balão manter a mesma forma, porém dessa vez cada ponto irá se mover independentemente, com isso surgirão forças aplicadas nos diversos pontos do balão, causando uma deformação dos meridianos e dos paralelos.
Em 1954, a dupla de físicos Yang e Mills, demonstrou que se uma interação física tem simetria global e exigirmos que ela também seja invariante por simetria local, teremos então que colocar novos campos na interação desejada, isso porque precisamos dar origens àquelas forças “ponto-a-ponto” que surgem da simetria local. Esses novos campos são chamados de campos de gauge, que serão muito importantes para esse texto, uma vez que estão associados a bósons sem massa (como o caso do fóton).
Apenas linhas paralelas |
apenas os meridianos. |
sobreposição dos meridianos e paralelos |
A interação fraca é descrita por um campo de gauge, assim ela possui simetria local, um tipo específico que chamamos de SU(2), mas essa nomenclatura não importa muito para esse texto. Como sabemos, campos estão associados à partículas e as partículas associadas a campos de gauge são bósons vetoriais massivos. Pô, mas eu acabei de dizer acima que Yang-Mills previa bósons vetoriais não massivos, mas agora a interação fraca requer bósons massivos?! Tem um problema aí?!
Sim, a teoria feita por Yang e Mills tinha um problema, quando ela tentava descrever bósons massivos surgiam valores infinitos nas equações, e isso significa que alguma coisa deu merda. Quando surgem infinitos em uma teoria dizemos que ela não é uma teoria renormalizável para aquela situação, assim ela não funciona direito. Afim de descrever a forma com que os bósons na teoria de Yang-Mills ganham massa, algumas idéias foram propostas, e a principal delas pode ser vista nessa imagem abaixo:
Esses papers, acima mostraram que os bósons vetoriais da Teoria de Yang-Mills poderiam ganhar massa a partir de uma mecanismo que quebra esponataneamente a simetria de gauge. Esse mecanismo é chamado de “mecanismo de higgs” e ele quebra a simetria que impedia os bóson vetoriais ganharem massa. Podemos chamar esse evento de quebra de simetria eletrofraca, pois está associado a essa interação. A essa quebra de simetria eletrofraca existe um bóson associado, o bóson de Englert-Brout-Higgs-Guralnik-Hagen-Kibble, injustamente conhecido apenas como bóson de Higgs.
3.2 – Mecanismo de Higgs, e a coisa fica mais complicada.
Aqui vamos precisar de um pouco de matemática, mas não se assuste, muito provavelmente você não irá entender algumas coisas, mas meu foco é que você entenda ao menos o que cada termo das equações abaixo significa.
A pergunta inicial aqui é “como descrevemos um campo matematicamente ?”. Para fazer isso nós usamos a energia do campo, subtraímos a energia potencial da energia cinética do mesmo, da seguinte forma:
$L=K-V$
$K$ é o termo cinético e $V$ é o termo potencial, a essa subtração damos o nome de Lagrangiana. São essas lagrangianas que descrevem o comportamento do campo. Se considerarmos um campo escalar massivo da seguinte forma:
Esse campo é chamado de dubleto, pois possui dois termos e o que nos interessa é o de baixo, $\phi^{0}$. $\phi^{+}$ está associado a um campo não físico e $\phi^{0}$ está associado ao famoso campo de Higgs, dado por:
$H$ é um campo real escalar associado ao bóson de Higgs e $v$ é a relação $\mu/\sqrt{\lambda}$. A Lagrangiana² que descreve o campo é a seguinte:
$D_{\mu}$ é uma derivada covariante em quatro dimensões de $\Phi$, "Dagger" ($\dagger$) indica que é um conjugado hermitiano da derivada de $\Phi$ e de $\Phi$.
Tá, mas e agora? o que fazemos com isso?
O primeiro passo que devemos dar é esquecer o termo cinético e encontrar o termo de potencial mínimo. Potencial mínimo pode ser entendido classicamente de forma simples. Imagine uma montanha russa, na parte mais alta dela a energia potencial é máxima, na parte mais baixa a energia potencial é mínima, se o campo fosse uma montanha russa nós estaríamos tentando encontrar a parte mais baixa dele. O potencial mínimo é chamado de vácuo, e assim como a montanha russa, podemos ter vários pontos de mínimo, ou seja, de vácuos. Quando formos tentar encontrar o mínimo do potencial na lagrangiana do campo, nós encontraremos apenas um vácuo de todos os possíveis. Nesse contexto a quebra espontânea de simetria “escolhe” um vácuo possível do sistema. Ou seja, escolhe um mínimo do potencial.
Ok, eu sei, ficou confuso então tentarei dar um exemplo mais simples. Imagine que você está em uma mesa de jantar redonda repleta de pessoas, e existem copos à direita e a esquerda de cada pessoa, como na imagem a baixo.
Ok, eu sei, ficou confuso então tentarei dar um exemplo mais simples. Imagine que você está em uma mesa de jantar redonda repleta de pessoas, e existem copos à direita e a esquerda de cada pessoa, como na imagem a baixo.
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como você pode ver, o copo a esquerda de um será sempre o copo a direita do outro |
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a pessoa número 1 acabou fazer a escolha do copo a sua esquerda, isso irá forçar a pessoa número 2 a escolher também o copo da esquerda, assim sucessivamente. |
Antes de você escolher seu copo, todos têm a chance de escolher o copo da direita ou da esquerda, porém se você resolver beber no copo da esquerda irá forçar as outras pessoas a escolherem o copo da esquerda também. Isso é a quebra espontânea de simetria. As pessoas representam o campo e o copo representa o mínimo de potencial (vácuo).
minimo de potencial no campo de Higgs |
Tomando o mínimo do potencial (derivando o potencial), como eu tinha dito, obtemos:
Agora basta fazer uma substituição direta de $\Phi^{2}$ no potencial $V$ e obtemos:
$H$ é nosso Bóson de Higgs com massa de $2\lambda v^{2}$, o $H^{3}$ e $H^{4}$ são termos que chamamos de auto-interação. Nós acabamos de fazer um monte de conta, mas o que elas significam é algo ainda mais bonito. Traduzindo em palavras, o que temos é um bóson vetorial que não possuía massa, mas após uma quebra espontânea de simetria local ele ganha massa. Esse mecanismo de uma partícula sem massa ganhar massa na quebra de simetria é chamado de mecanismo de Higgs e pode ser resumido assim:
Note que nesse resumo, 3 campos escalares massivos desaparecem, isso acontece porque os bósons sem massa “engolem” esses campos e adquire massa. Da mesma forma que fizemos para um bóson, podemos fazer para férmions, como é o caso do elétron, mas aí é muito mais complicado e não cabe nesse texto.
Acima demonstrei e falei muitas coisas extremamente complicadas que só começam a ser vistas pelos físicos no mestrado e doutorado, logo abaixo voltarei a tratar em termos leigos alguns aspectos que considero importante sobre a existência do campo de Higgs.
3.3 – Higgs existe? Ele está ligado ou desligado?
O Higgs está envolvido de formas diferentes à massa de determinadas partículas. Por exemplo, o Higgs dá massa diretamente às partículas elementares conhecidas, férmions e bóson, como elétrons, quarks, bóson Z e W, etc. Embora os prótons sejam formados por 3 quarks, grande parte de sua massa vêm da interação forte. Mas meu foco aqui será: o campo de Higgs existe? Se existe ele está “ligado” ou “desligado”?
Começaremos com uma ilustração clássica e simples que é correlata – O campo elétrico é bem diferente do campo de higgs em muitos aspectos, mas para esse exemplo ele funciona bem. Vocês se lembram daquelas TV's de tubo de antigamente? Então quando a ligávamos e passávamos perto da tela, sentíamos os pelos do nosso braço se arrepiarem, nesse caso o campo elétrico estaria ligado. Um campo elétrico desligado seria uma região neutra, como a que você está agora provavelmente. Sendo assim, o campo elétrico existe e pode ser medido, mas ele pode estar “ligado” ou “desligado”.
Com o Higgs acontece algo semelhante, se ele existir de fato no nosso universo, ele pode estar “ligado” ou “desligado”. Detectar um bóson de Higgs confirma a existência do campo de Higgs e mostra que ele está ligado. Usando o elétron como exemplo, se o campo de Higgs não existisse, ele não teria massa. Se o campo de Higgs existisse, mas não estivesse ligado, então sua massa seria menor do que a observada, pois teria origem na força nuclear forte e em pequenas interações entre os elétrons e o campo de Higgs desligado.
Agora que sabemos onde, como e porquê o bóson de Higgs surge, vamos nos focar em aspectos experimentais e propriedades específicas, mas esse texto já tem informações demais, então darei uma semana para você tentar digerir isso tudo até a postagem do próximo texto. Minha intenção na sequência é continuar fazendo um misto de assuntos mais técnicos e com mais leigos, vamos analisar dados, falar de acoplamento e outros termos técnicos e legais. Espero que tenham gostado.
Bibliografia:
- The Higgs Hunter's Guide - Dawson etall- 1990
- P.W. Higgs, Phys. Lett. 12 (1964) 132, Phys. Rev. Lett, 13 (1964) 508,
Phys. Rev. 145 (1966) 1156; F, Englert and E. Brout, Phys. Rev. Lett
13 (1964) 321; G-S. Guramik, C.R. Hagen and T.W.B. Kibble,
Phys. Rev. Lett. 13 (1964) 585; T.W.B. Kibble, Phys. Rev. 155 (1967)
1554.
- S. Weinberg, Phys. Rev. Lett. W (196?) 1264; A. Salam, Proceedings of
the 8th NoM Symposium (Stockholm), edited by N. Svartholm (Almqvist
and Wiksell, Stockholm, 1968) p. 367.
- S. Glashow, Nvcl. Phys. 22 (1961) 579.
- M. Veltman, Acta Phys. Pol. B8 (1977) 475.
- B.W. Lee, C, Quigg and G.B. Thacker, Phys. Rev. Lett. 38 (1977) 883;
Phys. Rev. D16 (1977) 1519.
- L. Susskind, Phys. Rev. D20 (1979) 2619; S. Weinberg, Phys. Rev. D19
(1979) 1277.
- I.J.R. Aitchison and A.J.G. Hey, Gauge Theories in Particle Physics
(Adam Hilger, Bristol, 1982).
- T.-P. Cheng and L.-F. Li, Gange Theory of Elementary Particle Physics
(Oxford University Press, Oxford, 1984).
- H.E. Haber and G.L. Kane, Phys. Rep. 117C (1985) 75.
- Theory of Higgs Bosons: The Standard Model and Beyond.
- Introduction to the Physics of Higgs Bosons.
1 - Gauge pode também ser traduzido como "calibre". Viu que legal agora você já sabe o que o nome desse blog significa.
2 - Eu escrevi na verdade uma densidade lagrangia e não uma lagrangiana em si, embora todos tenham mania de chamar tudo de lagrangiana.
3 - Não repare nas imagens dos copos, fiz às pressas no Photoshop.
gostaria de agradecer a Rúbia Guimarães e Rebeca Nogueira pela bondade em corrigir o português deplorável com o qual esse texto foi escrito.
Bibliografia:
- The Higgs Hunter's Guide - Dawson etall- 1990
- P.W. Higgs, Phys. Lett. 12 (1964) 132, Phys. Rev. Lett, 13 (1964) 508,
Phys. Rev. 145 (1966) 1156; F, Englert and E. Brout, Phys. Rev. Lett
13 (1964) 321; G-S. Guramik, C.R. Hagen and T.W.B. Kibble,
Phys. Rev. Lett. 13 (1964) 585; T.W.B. Kibble, Phys. Rev. 155 (1967)
1554.
- S. Weinberg, Phys. Rev. Lett. W (196?) 1264; A. Salam, Proceedings of
the 8th NoM Symposium (Stockholm), edited by N. Svartholm (Almqvist
and Wiksell, Stockholm, 1968) p. 367.
- S. Glashow, Nvcl. Phys. 22 (1961) 579.
- M. Veltman, Acta Phys. Pol. B8 (1977) 475.
- B.W. Lee, C, Quigg and G.B. Thacker, Phys. Rev. Lett. 38 (1977) 883;
Phys. Rev. D16 (1977) 1519.
- L. Susskind, Phys. Rev. D20 (1979) 2619; S. Weinberg, Phys. Rev. D19
(1979) 1277.
- I.J.R. Aitchison and A.J.G. Hey, Gauge Theories in Particle Physics
(Adam Hilger, Bristol, 1982).
- T.-P. Cheng and L.-F. Li, Gange Theory of Elementary Particle Physics
(Oxford University Press, Oxford, 1984).
- H.E. Haber and G.L. Kane, Phys. Rep. 117C (1985) 75.
- Theory of Higgs Bosons: The Standard Model and Beyond.
- Introduction to the Physics of Higgs Bosons.
1 - Gauge pode também ser traduzido como "calibre". Viu que legal agora você já sabe o que o nome desse blog significa.
2 - Eu escrevi na verdade uma densidade lagrangia e não uma lagrangiana em si, embora todos tenham mania de chamar tudo de lagrangiana.
3 - Não repare nas imagens dos copos, fiz às pressas no Photoshop.
gostaria de agradecer a Rúbia Guimarães e Rebeca Nogueira pela bondade em corrigir o português deplorável com o qual esse texto foi escrito.
domingo, 13 de outubro de 2013
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